segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Os Anéis

Hoje a história não vai ser nem pequena nem fofinha. Vai ser agridoce, como na vida real. Como na minha vida.

Lembro da sua mãe tentando descobrir que número de aro de anel eu usava. Ela me contou suas intenções e me pediu pra fazer surpresa. Nem precisei fingir, porque pra mim foi realmente uma surpresa quando você tirou a caixinha da bolsa, ajoelhou no meio do metrô e me pediu em namoro. Lembro que te beijei e lembro que algumas pessoas até aplaudiram. Por muito tempo aquele anel representou, pra mim, nosso relacionamento. Usava o tempo todo. Você era importante pra mim dessa forma.
Então veio o primeiro pedido de término. Nós nos vimos depois daquilo e eu quis te devolver o anel. Você não aceitou. Acabei ficando com ele e não muito tempo depois, voltamos. Você mesmo disse que durante aquele tempo longe agimos como se ainda estivéssemos juntos. E realmente, nada tinha mudado. Tivemos nossos momentos bons e nossos momentos difíceis. Você hesita demais. E eu me dedico demais. Mudei por você, me privando de muitas coisas. Você também acabou se privando de coisas que eram importantes pra você, apesar de ser em uma escala bem menor que a minha.
Com o tempo, apesar de continuar querendo manter o relacionamento, comecei a perceber várias coisas que me incomodavam. Você me elogiava, eu ficava feliz e passava. Mas com o tempo, a sensação voltava. Nossos passeios se resumiam a um único tipo de encontro, uma experiência que eu já tinha tido e não tinha gostado. Sempre que eu tentava fazer algo diferente você se esquivava. "Vamos no ano que vem". Se eu soubesse quais eram suas intenções, teria te forçado a ir. Se eu soubesse quais eram suas intenções, teria te cobrado mais. No entanto, minha natureza até hoje foi a de dar, a de me entregar. Pelo menos não tenho arrependimentos.
Já pensei em como seria se te visse de novo. Já me imaginei dando um tapa no seu rosto por você não ter tido coragem de terminar as coisas direito. Já senti raiva de não ter conseguido te devolver o anel. Penso que estou bem até ter algum tipo de recaída e começar a chorar de novo. Você já sabia que pra mim ia ser mais difícil. Eu nunca aceitei. Mesmo agora, falo e repito que terminamos pra ver se entra na minha cabeça minha atual e real situação. Estou sozinha de novo.
Você continua falando comigo como se tudo estivesse bem. Pra mim não está. Eu sinto sua falta e sei que vou sentir por muito tempo até me acostumar com a minha nova realidade. Não pretendo voltar tão cedo. Você vai continuar hesitando e eu vou continuar sofrendo. As coisas não deviam ser assim. Por essas e outras razões que disse que, da próxima vez que você quiser ter algo sério, que tenha certeza que é pra valer. Eu não namoro pra passar o tempo nem pra me divertir. Eu me dedico de corpo e alma. Acho que o mínimo que mereço é algo equivalente. Se não for capaz de me dar isso, então continue sua vida e eu continuo a minha. Afinal, foi o que me disse pra fazer. Seguir a vida. Está difícil, mas é o caminho que tenho. No início eu queria te devolver minha aliança mas, agora, o que eu queria mesmo era que você me desse a sua. Você começou e terminou tudo isso. Foi uma brisa mansa que se tornou um furacão. Eu não posso esquecer, mas vou carregar comigo as lembranças pra tentar não passar de novo por tudo isso. A lição que fica é não deixar que minha felicidade dependa dos outros, muito menos de meros simbolismos. É que eu tenho que aprender a lidar melhor com as pessoas que gosto, pois a maioria delas não faz por mim metade do que faço por elas, e isso é injusto. Que se relacionamentos fossem realmente como uma troca, eu estaria perdendo muito e os outros ganhando muito. E eu estou cansada de ser a única perdendo.

domingo, 29 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Céu

Historinha pequenininha e bonitinha para aquecer os corações nessa noite fria.

Quando eu era pequena gostava d ficar do lado de fora de casa, deitada na grama, olhando pro céu. Minha mãe até me mandava ir brincar com as outras crianças, mas elas eram muito agitadas. Tinham vezes que eles até inventavam brincadeiras divertidas e eu participava. Uma vez brincamos de fazer bolhas de sabão. Foi bastante divertido. Gostava de soprá-las pra cima depois de feitas e observar enquanto caiam no chão. A maioria das outras crianças gostavam mesmo era de soprar e estourar as bolhas.
Outra brincadeira que eu gostava muito era de esconde-esconde. Eu costumava subir em uma árvore e ficar lá, até que me encontrassem. Funcionou até que se acostumassem a me achar nas árvores e eu desisti de brincar. Era muito entediante me esconder em outros lugares.
Quando todos nós entramos na escola eu achei o fim. Ficava muito tempo dentro da sala de aula e quando saíamos, era pra fazer educação física. Não dava tempo de olhar o céu de dia, então comecei a observar o céu de noite. Teve um dia que até vi uma estrela cadente! Lembrei das histórias que me contavam e fiz um pedido. Mas demorou muito tempo até que ele se realizasse.
Cresci e descobri algumas profissões que estudavam o céu. Descobri a astronomia e a astrologia, os cientistas e os astronautas. Tantas opções! Mas conforme fui tentando me envolver com cada uma delas, fui percebendo que cada uma tinha seus pontos de sacrifício. E eu não estava disposta a sacrificar nada. Foi quando me deram a melhor sugestão. E comecei a pintar.
Comecei com um caderno de desenho. Daqueles pequenos, na época da escola mesmo. Sempre que me pediam pra desenhar algo, eram nuvens em um céu azul. Assim mesmo. Às vezes desenhava um sol. Uma vez até tentei desenhar o céu de tarde, mas disseram que tinha ficado feio e resolvi não tentar de novo. Por um bom tempo, não tive coragem de pintar céus no entardecer. Uma pena, pois conforme crescia, se tornava meu favorito. Era divertido pintar um céu noturno com estrelas. Também era fácil desenhar um céu diurno com nuvens. Mas os céus que realmente me encantavam eram aqueles cheios de cores e texturas. Um céu nublado cheio de nuvens de chuva, por exemplo. Ou o céu no amanhecer. Poucas pessoas sabem como parece o amanhecer. Eu mesma só fui conhecê-lo quando comecei a trabalhar.
A transição de cadernos de desenho para telas se deu mais ou menos nessa época. Trabalhando era mais fácil ter dinheiro para comprar materiais nobres. No entanto, faltava tempo. Nunca pintei pensando em expor, mas um amigo viu e resolveu tentar. Foi um sucesso pelas primeiras semanas mas conforme o tempo passou, começaram a surgir reclamações. Só tinham pinturas de céu. As pessoas esperavam mais.
Só que eu não, então fiquei um tempo sem expor minhas pinturas. Passei a ser uma artista sazonal e funcionou bem pra mim. Não era tão corrido e ainda tinha um público fiel que comprava minha arte. Como não era minha principal fonte de renda, não passava necessidade. Pensava em como devia ser para uma pessoa que realmente se dedicasse de corpo e alma àquela profissão. Mas nada disso fez com que minha paixão mudasse. Minha primeira viagem de avião foi uma das melhores experiências que vivi. Tive outras, mas não me causavam a mesma empolgação.
Troquei de empregos algumas vezes. De namorados, mais uma porção delas. Me chamavam de avoada, de cabeça nas nuvens. Não me ofendia. Era bem o que eu era mesmo. Uma garota com a mente e o coração nas alturas.

sábado, 28 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - O Sonho

Historinha pequenininha e bonitinha para aquecer os corações nessa noite fria.

Sentada na Lua, olhava para o céu. Estático, sem brilho, gelado. Sentia como se me tirasse o ar, como se me prensasse contra o firmamento. Ainda assim, era a visão que eu tinha. Uma estrela passou voando e caiu bem do meu lado. Levei um susto.
-Quer vir comigo?
Eu estava sozinha, que mal faria? Montei nela e saímos voando por aí. Mas tudo era muito. Ou muito quente ou muito frio, ou muito grande ou muito pequeno, ou muito gasoso ou muito sólido. Até que a estrelinha caiu em um lugar diferente. Tudo era tudo, e as estrelas brilhavam. O chão não era frio, mas era úmido. Fechei os olhos.
-Não podemos ficar muito.
-Eu sei.
Realmente sabia. Mas era aconchegante e confortável. Quente e carinhoso. Me deixei ficar. A estrelinha foi perdendo forças e se despediu. Se ficasse mais, sumiria. Não me importava de sumir ali. O cheiro invadia minhas narinas e ia bem fundo nos meus pulmões, me fazendo sentir sensações que não conhecia.
Foi ficando quente. Muito quente. Dava pra ver o círculo de fogo queimando. Machucava só de olhar. Não queria, mas me senti atraída por aquela dor. Era como se me sugasse pra dentro dela. Peguei carona com o vento, que me içou nas alturas, alto o suficiente para flutuar para fora. Tudo tinha voltado ao que costumava ser, menos aquele círculo de luz e de fogo. Tinha que chegar mais perto. A estrelinha reapareceu, com energias renovadas.
-Posso te levar até lá, mas não recomendo, será seu fim.
-Não me importo.
Era melhor me queimar naquele fogo que viver o resto de meus dias sem saber como era aquela sensação. Ela me levou o mais perto que podia.
-Não posso passar daqui, até eu tenho minhas limitações.
-Aqui está bom.
Peguei impulso em minha amiga, que chispou no instante seguinte. Tive a impressão de que ela chorava por mim e quis dizer que não precisava se preocupar, pois eu estaria bem. Teria voltado para casa. Toda sombra precisa de uma luz para existir e eu era nada mais que uma sombra, esperando para me juntar à minha criadora.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Um Lago na Floresta

História de hoje era pra ser a história de ontem. Percebi, enquanto a escrevia, que tenho uma extrema dificuldade quando me inspiro demais a terminar a história pelo rumo que queria. Essa é inspirada em quadrinhos que li do Tio Patinhas uma vez, a coisa mais linda de todas, que nunca esqueci. Espero que gostem!

Somos de uma tribo nômade do deserto de Cassim. Não é que não existam outros lugares para morarmos, mas esse deserto já é nosso lar, e nos sentimos confortáveis nele. Já estamos aqui há várias gerações e acabamos aprendendo muitas lendas e histórias desse lugar. Afinal, não somos os únicos habitantes desse deserto. E uma delas é a que vou lhes contar agora, que me envolve diretamente.
Quando era criança minha mãe me contava sobre a lenda de um lago que aparecia no meio do deserto a cada 20 anos. Supostamente, uma bela garota vivia no fundo desse lago, mas todos que tentavam se aproximar dela morriam afogados. Era nossa própria sereia, presa em algo que poderia ser considerado uma poça d'água em comparação à imensidão dos outros lugares onde ouvíamos falar da ocorrência de sereias. Era como eu imaginava pelo menos.
Eu tinha uns oito anos quando aconteceu. Não conseguia dormir à noite e acabei notando quando o céu ficou claro. Não como o dia, mas muito mais claro do que qualquer outra noite que eu já havia vivido. Saí da minha tenda e, como toda criança curiosa que existe por aí, fui olhar o que estava acontecendo. Por algum motivo que não sei explicar, a lua estava brilhando muito mais do que o normal e parecia mais próxima também. Comecei a ouvir alguns barulhos ao longe e resolvi seguir até lá e ver o que estava acontecendo. Foi quando descobri que era real.
O som que eu ouvia era uma voz misturada com água borbulhante. A água realmente borbulhava enquanto saía da areia e enchia uma cavidade enorme que tinha ali perto. A voz eu tive um pouco mais de dificuldade de conseguir perceber de onde vinha. Era tão bonita e doce, me encheu imediatamente de calma. Fechei os olhos, levantei a cabeça e comecei a girar em torno dos meus pés, uma brincadeira que eu costumava fazer quando estava entediado. Rodopiava até me sentir tonto e cair na areia, e ali ficava até a sensação de cabeça girando passar. Foi exatamente o que eu fiz naquele momento. E depois que caí na areia, percebi que a voz tinha parado. Abri os olhos e vi uma figura rodopiando lentamente na minha frente.
-Você está bem?
Ela me estendeu a mão. Eu ainda estava tonto e acabei tropeçando. Acabamos caindo, dessa vez os dois, na areia. Eu ria sem parar e ela começou a rir também. E foi ali que percebi que era a mesma voz.
-Cante mais um pouco pra mim, sua voz é linda.
-Você acha?
-Acho! É mais bonita que a voz da minha mãe, e olha que não tem ninguém com a voz mais bonita do que minha mãe.
Era verdade. Minha mãe costumava cantar nos rituais e festivais que fazíamos. Mas não se comparava à voz dela. Parecendo muito feliz com o elogio, mesmo que tivesse vindo de uma criança, ela se sentou com as pernas cruzadas, estendeu os braços para a frente, fechou os olhos e começou a cantar novamente. A mesma canção que estava cantando há pouco. Apurei os ouvidos e percebi que ela tinha um tom um tanto quanto triste, mas não deixava de ser maravilhosa. Não pude deixar de perceber também que a água parecia sair com mais rapidez conforme ela cantava. Quando terminou, colocou as mãos juntas em frente ao peito e murmurou algumas coisas que não consegui entender. Depois jogou as mãos para trás do corpo e se apoiou nelas, os cabelos esvoaçando com a brisa noturna. Ela estava olhando para a lua e eu para ela.
Ficamos daquele jeito longamente até que ela rompeu o silêncio.
-Você é um garoto muito especial, mas devia ir para sua casa agora. As coisas vão ficar perigosas.
-Por quê?
Estava perguntando mais para saber o motivo de ter que ir embora. Que perigos podiam existir ali, no meio do deserto? Ela respirou profundamente e levantou de um salto.
-Está chegando.
Antes que eu percebesse o que estava acontecendo, senti uma pancada na parte de trás da minha cabeça e apaguei. Só acordei no dia seguinte, deitado na frente da minha tenda. Já era dia, mas corri para o local onde estava a água. A água ainda estava lá, mas não tinha nem sinal dela. E eu nem tinha perguntado seu nome.
-Venha pescar com a gente!
Algumas pessoas estavam lá, com varas de pescar improvisadas, todos sentados ao redor do lago que tinha se formado. Sentei ao lado de minha mãe, abracei os joelhos e fiquei pensando na moça. Se ainda voltaria a vê-la. A lua não estava brilhando forte naquela noite e ela não estava em nenhum lugar que pudesse ser encontrada. Íamos partir em alguns dias, e por todos eles voltei ao lago. Em um deles tive a impressão de que tinha algo bem no meio dele, mas estava bem longe pra conseguir distinguir o que era.
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Lembro que com vinte e oito anos ainda me lembrava daquela história. Minha mãe me cobrava que eu me casasse,pois estava perto da idade, mas não queria. Não se não fosse com ela. Depois daquele dia e por muitos anos que se seguiram, ainda lembrava perfeitamente da sua voz, do seu rosto e da sua risada. Preparei um presente digno dela para pedi-la em casamento e minha mãe, curiosa que era, quando o encontrou soube na hora para que propósito tinha feito. Tinha começado a me atormentar desde então. Provavelmente esperava que fosse para alguma das garotas do nosso povoado. Nunca tinha lhe contado o que tinha acontecido naquela noite. No entanto, tinha certa influência sobre o nosso líder. Ele era meu amigo de infância, então me tinha como um conselheiro. Quando a coisa aperta, duas cabeças pensam melhor que uma. Consegui com certo esforço que nossa caravana estivesse próxima o suficiente do lugar em que estivemos quando eu tinha oito anos. Não é que eu tivesse medo que desconfiassem, mas eu tinha esperança de vê-la de novo. Se a visse dessa vez com certeza a pediria em casamento. Mas tinha um medo dentro de mim. E se ela não me reconhecesse? Afinal, eu era uma criança na época. Nem me passou pela cabeça, mas e se ela tivesse envelhecido? Acreditava do fundo do meu coração que ela continuaria linda, mas e se ela me rechaçasse por esse motivo? Insistiria até a morte!
Naquela noite a lua brilhou novamente. Corri para o local e, mesmo vendo as águas que jorravam para encher o lago, me enfiei dentro delas e fui em direção à voz. Tinha mesmo um lugar bem no meio do lago e era lá que ela estava. Então descobri meu primeiro obstáculo. Não sabia seu nome. Escalei o monte e cheguei lá me sentindo exausto. Olhei pra baixo e estranhei, o monte não parecia maior do que vários montes de areia que já tinha tido que atravessar pelo deserto com a tribo. Virei meu rosto e quase caí monte abaixo, pois dei de cara com o rosto dela praticamente colado no meu.
-Você voltou.
Sua voz parecia ter uma alegria contida e um tom muito reconhecível de preocupação. Olhou para trás e depois de volta pra mim.
-Não devia estar aqui.
Rapidamente peguei o presente que tinha preparado, um enfeite de cabelo feito com penas de aves raras e pérolas que cultivadas debaixo do sol. Me ajoelhei e mostrei o presente.
-Quero que case comigo - disse rapidamente, sem pensar - e também quero saber seu nome!
Ela pareceu em choque por uma fração de segundo após ouvir minha proposta e se pôs a rir imediatamente após eu perguntar seu nome. Era incrível, pois ela estava exatamente como eu me lembrava.
-Meu nome é Naara - ela começou, enquanto estendia sua mão para o nada - e aceito sua proposta, se você passar no teste.
Quando ela disse aquilo, em sua mão estendida começou a se formar algo que parecia uma lança de areia. Ela a jogou para mim e eu a apanhei. Lembrei da história que minha mãe contava e dos homens que tinham morrido. Se era o risco que tinha que correr para me casar com ela, a enfrentaria de bom grado. Esperei que ela terminasse de conjurar sua própria lança e me coloquei em posição de ataque. Ela pareceu satisfeita.
-Ótimo, parece que não vou ter que te ensinar como faz. Se prepare, ele já vai aparecer.
Ele? Eu não estava entendendo nada, mas mantive minha posição. Foi uma surpresa para mim quando, de dentro da água, um, tentáculo gigante surgiu. Foi muito rápido e eu não consegui reagir. Ela me protegeu e foi pega. Gritei seu nome. Não queria acreditar que estava sendo separado dela logo após tê-la encontrado depois de tanto tempo. No entanto, a separação foi curta, pois logo em seguida um tentáculo que bem poderia ser o mesmo apareceu e me puxou para a água também.
Achei que sua intenção era me afogar então prendi minha respiração. No entanto, quando não aguentava mais, acabei soltando o ar, que saiu com a mesma facilidade que teria saído se eu estivesse respirando ar. Tentei inspirar e entrei em pânico quando senti como se uma gosma estivesse preenchendo meus pulmões. Mas era respirável. Tentei me acalmar um pouco e entender a situação. Percebi que na verdade, o tentáculo que me prendeu não era o mesmo que pegou Naara, mas pertencia à mesma criatura. Uma criatura enorme, diga-se de passagem. Pensei em me desvencilhar do tentáculo mas, se o fizesse, perderia a chance de salvá-la. Tinha perdido minha lança e a única coisa pontuda que tinha em minha posse era o prendedor que tinha preparado para ela. Não vi muitas outras opções. Nadei com todas as forças que tinha para perto do monstro e finquei a presilha várias vezes, em vários pontos. Não estava vendo naquele momento, mas do outro lado do monstro, ela estava usando sua lança para fazer o mesmo. Não sei quanto tempo nossa luta durou, mas sei que foi longa e cansativa. O monstro foi derrotado e começou a afundar. Naara me avistou, nadou até mim, me pegou pela mão e nadou logo atrás do corpo do monstro. Não me atrevi a perguntar o porque de estarmos nadando para o fundo do lago ao invés da superfície. Até que chegamos do outro lado.
A paisagem era muito, muito diferente do deserto. Tinha vegetação abundante por todos os lados, de cores bem diferentes das que eu costumava ver em minha terra.
-Não podemos demorar.
Ela me puxou com toda a força até uma das árvores mais próximas, se agarrou em um cipó e puxou. Ele, em reação, nos içou para cima. Quase me senti sendo pescado. Instantes depois pude perceber várias criaturas se aproximando da carcaça do monstro e a devorando, até que não sobrasse mais nada. Foi tão rápido que imaginei que, se tivessem a capacidade de nadar, teriam derrotado a criatura muito mais rápido que eu e Naara em nossos esforços.
-São carniceiros - ela começou a explicar em voz baixa - mas temos que tomar cuidado, pois não conseguem se controlar muito bem quando sentem o cheiro de morte. Muitas pessoas já perderam a vida por não respeitarem essa lei simples.
Então olhou pra mim e sorriu. Apontou para o prendedor em minha mão e, quando olhei para ele, estava em frangalhos. Ela o tomou de minha mão antes que eu pudesse reagir.
-Vou ficar com ele. Mas seria bom você voltar pro lado de lá. O tempo passa de forma diferente do lado de cá e do lado de lá. Não vai querer perder a sua caravana.
Senti uma enorme tristeza por pensar que teria que me separar dela novamente. Como se sentisse essa dor, ela tomou minha mão e me acompanhou por todo o caminho de volta. Lá, a encarei longamente enquanto segurava suas mãos entre as minhas.
-Se casaria mesmo comigo?
-Você se provou bastante útil contra aquele lá. Mas somos de mundos diferentes.
Eu entendia aquilo e baixei a cabeça, pensativo. Devia haver alguma forma de mantê-la aqui, do meu lado.
-Nos veremos de novo?
-Quem sabe? Se for nosso destino.
Me roubou um beijo e pulou de volta para a água em um instante. Não tive coragem de segui-la, mas esperei até de manhã para ver se reapareceria. Não aconteceu. Voltei para minha aldeia na certeza de que, dali vinte anos, voltaria para revê-la. E que dessa vez, ficaríamos juntos, com certeza.
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O tempo às vezes é cruel com as pessoas. Conforme o tempo passava percebia que perdia minha convicção de que poderíamos ficar juntos. Eu já teria quarenta e oito anos e ela ainda estaria tão jovem quanto na primeira vez que a vi. As obrigações sociais fizeram com que houvesse pressão não só por parte de minha mãe mas de toda a aldeia para que eu me casasse. O fiz. Tive dois filhos e, quando cheguei aos quarenta e oito anos, já tinha tido dois filhos. Não voltei ao lago. Meus filhos cresceram e se tornaram adultos. Já eu, me tornava um velho. ninguém ligava muito para a falta de um velho quando ele sumia, pois muitos deles preferiam morrer sozinhos no deserto que dar trabalho para suas famílias. Pensei que aquela seria minha última chance de vê-la antes de partir do meu mundo. Então parti em uma jornada até o monte em que ela aparecia quando cantava para as águas transbordarem. Cheguei cedo, mas foi totalmente recompensador. Ela apareceu na minha frente e, quando meu viu, abriu aquele sorriso que eu tanto amava.
-Você voltou!
Estendi meus braços e ela se deixou cair neles, me abraçando.
-Como sabe que sou eu? Envelheci tanto...
-Eu sempre sei.
Ficamos quietos por um tempo, só apreciando o momento. Foi quando lembrei de um fato importante.
-Se um monstro aparecer dessa vez, não acho que tenho forças pra lutar.
Ela sorriu e tomou minha mão. Mergulhamos e senti novamente aquela sensação peculiar da gosma entrando em meus pulmões. Parecia mais pesado e denso do que me lembrava. Do lado de lá, ela colocou minha mão em seu rosto e fechou os olhos, com uma expressão que parecia muito feliz.
-Agora podemos ficar juntos. Derrotei o último na última vez que subi. Fiquei um pouco triste de não ter te visto, então voltei hoje de novo, para ver se te encontrava. Não sabia o que ia fazer se não encontrasse. Durante todo a minha vida só aprendi duas coisas. Uma, a lutar contra os monstros. Duas, te amar. Não quero que vá embora dessa vez. Fique comigo.
-Mas eu estou velho.
-O tempo passa diferente aqui, lembra? Podemos viver muito tempo juntos ainda. Você quer ficar comigo?
Segurei sua mão e a trouxe para meus lábios.
-Não tem nada que eu tenha querido na vida mais que isso.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Onde estão suas mãos?

Ontem o dia foi tão corrido que não consegui escrever. Mas vou postar a história de ontem hoje, pra compensar.

Na primeira vez que nos vimos, você foi tímido e mal falou. Ainda assim. fiz questão de te provocar, colocando a mão na sua perna. Estava bom e eu estava conseguindo quase muito bem dividir a atenção entre assistir o filme e esfregar a mão na sua perna. Até que você recuou, e eu instintivamente recuei minha mão também.
Na segunda vez que nos vimos, você me abraçou por trás, e foi uma sensação maravilhosa. Não sou do tipo que gosta muito de contato íntimo, mas aquele abraço foi maravilhoso. E sinto que você nunca mais me deu um igual. Fomos para outro lugar e lá você segurou meu rosto e me beijou. Naquele dia eu não sabia ainda, mas acho que foi uma das poucas vezes que você tomou a iniciativa de me beijar. E como nos beijamos! Lembra do guarda? Eu lembro.
Depois disso, ficamos várias vezes. Íamos no cinema. Fomos em um rodízio de comida japonesa pra que eu conhecesse sua mãe. Viajamos pra praia duas vezes. Nossos contatos foram ficando mais íntimos. Mesmo assim, tenho a impressão que você passou a se afastar de mim. Você nunca mais disse que gostava de mim, nem lembro se algum dia cheguei a te ouvir dizer que me ama. Você repeliu minhas tentativas de te beijar mais que uma vez. E você pediu pra terminar mais que uma vez.
Se era pra ser assim, por que então você segurou minha mão enquanto íamos para a entrada do condomínio? Por que segurou minha mão no táxi e, quando pensei que não queria mais, você a pegou de novo e continuou segurando? Por que me apresentou pra sua família se não pretendia continuar junto comigo? Por que fez cara feia quando eu fiz sinal de não com a cabeça quando você perguntou se eu queria tirar uma foto com os noivos? Por que colocou a mão na minha perna? Você me encheu de dúvidas e deixou em mim uma semente de esperança com sua indecisão. Você não sabe, nem eu.
O que eu sei é que você me mandou seguir minha vida. Sua inconstância me faz sofrer, a facilidade com que você me descarta quando tem algum problema também não facilita as coisas. Moramos longe. Temos uma diferença de idade enorme. Ainda assim, você me fez acreditar que era pra sempre. Mas como diz a música, o pra sempre sempre acaba. Um a um você matou meus sonhos, minhas expectativas, meus desejos. Você me deu sonhos com uma mão e os arrancou com a outra. Você me levou ao céu e ao inferno. Você me fez a pessoa mais feliz e a mais infeliz no espaço mais curto de tempo possível. Mesmo assim, nesse exato momento, quando paro pra pensar, só consigo lembrar de coisas boas ao seu respeito.
Onde estão suas mãos agora? Será que já encontrou outra mulher? Será que vai procurar outra mulher? Quais são seus planos pra agora? E pro futuro? Você acha mesmo que podemos continuar sendo amigos depois de tudo que aconteceu? Você e eu nunca fomos só amigos, pois desde o início, existia um interesse da sua parte. Eu mudei minha vida toda por você. O que você mudou por mim? Sei que sou parcialmente responsável por várias coisas ruins que você vê em você mesmo e me desculpo por isso. Nunca foi minha intenção. Queria ser feliz ao seu lado. Eu realmente passei a desejar isso. Agora não sei mais o que fazer da minha vida. Como te disse em algum momento de toda essa turbulência, vou catar os cacos e continuar. Mas aquela sementinha de esperança que existia em mim morreu. Então espero que, se algum dia você pretender ter algo comigo de novo, você tenha bastante certeza de que é isso que quer, e que quer pelo resto da vida. E espero que tenha paciência comigo, pois provavelmente não vai ser do mesmo jeito. Mas minhas mãos ainda são suas.

terça-feira, 24 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Ovos e Rosas

Hoje vai ser uma Fanfic. Primeiro por eu nunca ter tido a oportunidade de vivenciar café da manhã na cama e segundo porque eu realmente não aguento mais ficar triste e chorando. De Harvest Moon, Cam e Lilian.

Acordei cedo aquela manhã. Lilian tinha me dado a notícia que estava grávida na manhã anterior e eu tinha ficado em êxtase. Foi em cima da hora, mas resolvi fazer uma surpresa pra ela. Estávamos em Konohana, Phillip tinha insistido bastante para que nos mudássemos para lá desde que nos casamos. Já tinha passado uma estação desde então.
Naquela manhã, a primeira coisa que fiz foi olhar na geladeira se tinha leite. Por sorte, tinha. Não é que não gostasse dos animais, mas me dava melhor com as plantas. Agora só faltavam mais duas coisas: os ovos e as rosas.
Consegui sair de casa sem bater a porta. Olhei pela janela mesmo assim, só pra conferir, e ela continuava dormindo. Suspirei aliviado e me dirigi ao galinheiro. Elas ainda estavam dormindo também. Com o mesmo cuidado que tive para sair da casa, me aproximei de uma das galinhas.
-Com licença.
Não sei se ela me ouviu ou o que, mas ela abriu os olhos e ficou me encarando. Eu paralisei. Queria pegar o ovo, mas estava receoso que ela tentasse me bicar. Engoli em seco e enfiei a mão por debaixo dela. Tateei um pouco até sentir o que procurava, o ovo. Estava com ele em mãos, só precisava tirar. Achei que seria uma tarefa fácil, mas assim que tirei a mão de baixo da galinha, ela me bicou. Por sorte não deixei o ovo cair, mas tive que correr. Todas as galinhas acordaram com um mero cacarejo daquela galinha e começaram a correr atrás de mim. Corri e fechei a porta atrás de mim. Em Konohana, não tinha muito espaço pra criar animais. Me surpreendi como tão poucas delas podiam ser tão assustadoras.
Respirei fundo e olhei para a plantação. Ali sim eu me sentia bem. Procurei entre as flores que já estavam plantadas se já tinha alguma rosa que pudesse ser cortada. Pela minha experiência, ainda estavam um tanto quanto jovens, mas isso podia até dar um charme para a surpresa. Escolhi um dos botões mais viçosos e levei pra dentro. Quando entrei, quase me esqueci de não bater a porta. Dei uma espiadela no quarto e percebi que Lilian ainda dormia. Isso me daria tempo suficiente para preparar as coisas.
Primeiro, preparei um recipiente para a rosa. Depois fui para a cozinha, preparar uma omelete. Peguei o leite na geladeira e esquentei um pouco, só pra ela não tomar o leite frio. A omelete queimou um pouco aqui e ali, mas no geral, parecia boa. Comestível, para dizer o mínimo. Coloquei tudo em uma bandeja e me dirigi ao nosso quarto. Quando cheguei, ela ainda estava dormindo. Coloquei a bandeja de lado e segurei seu braço, enquanto a chamei gentilmente.
-Lilian?
-Hmm...
-Hora de acordar.
Ela abriu os olhos e se espreguiçou. Quando me viu, abriu aquele sorriso tão encantador do qual eu nunca me cansava.
-Fiz o café da manhã.
-Fez?
Seu rosto se iluminou quando olhou pra bandeja. A primeira coisa que fez foi pegar a rosa. Sentiu o perfume e colocou de volta. Então pegou o copo de leite.
-Obrigada pela comida.
Sentei ao seu lado e mais fiquei observando enquanto comia do que qualquer coisa. Ela comia com gosto, mesmo depois de encontrar um pequeno pedaço de casca de ovo no meio da omelete. Depois, ficou segurando minha mão enquanto me lançava olhares de canto de olho.
-Quer ajuda com a plantação? Não vou oferecer com os animais, pois eles me odeiam.
Ela riu e aqueceu meu coração. Não podia esperar para ver que tipo de criança nasceria de nós dois. E esperava do fundo do meu coração que parecesse com ela, pois com certeza seria a criança mais adorável do mundo.

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Julgamento

Todos fazemos isso, mesmo sem perceber. É fácil julgar os outros. Mas e quando a vítima de nossos julgamentos somos nós mesmos? Hoje vou contar uma história real envolvendo pessoas reais. 

Era uma vez uma garota. Essa garota era bastante quieta, bastante responsável e tinha um sorriso lindo, dentre outras qualidades. Ela tinha uma paixão secreta que tinha acabado de uma forma trágica e, por conta disso, havia, inconscientemente, se fechado para o amor. O medo de que ela amasse novamente e que desse errado era grande e ela não queria se arriscar.
Mas essa garota tinha uma amiga que gostava de arrastá-la pra todos os lados. E ela lhe apresentou muitas pessoas novas. Algumas eram apenas pessoas que passariam por sua vida e não fariam diferença nenhuma. Outras, no entanto, se encantariam com ela e tentariam conquistar seu coração. Só não sabiam  da grande barreira que existia em seus caminhos. Ela também não era uma garota fácil. No entanto, se pegou pensando em um dos pretendentes. E se desesperou pela lembrança do que tinha acontecido com o primeiro e único.
Procurou a amiga e confessou seus medos, suas lembranças e sua dor. E a amiga ofereceu ajuda para lhe dar confiança. Começaram a trocar emails. Então resolveram sair as duas junto com o pretendente escolhido. Existia um abismo entre eles durante as conversas, e a amiga fez o trabalho de mediadora. Era como se não se entendessem direito. Precisavam trabalhar naquele problema, e, se pretendiam mesmo dividir uma vida juntos, tinha que ser entre eles.
Começaram a namorar e passaram a ir pra todos os lugares juntos. Onde um ia, o outro também. Um par de vasos. Ficavam juntos ao ponto de quase não verem mais os amigos. Mas se tinham que ir pra algum lugar, iam juntos.
Noivaram. Casaram. E começaram a morar juntos. Tão concentrados em suas próprias vidas que esqueciam completamente dos outros ao redor. No entanto, os outros ao redor, por mais que sentissem falta, também não se mexiam para tentar uma reaproximação.
Nós, pessoas que vimos o relacionamento deles nascer e se desenvolver, desejamos do fundo do coração que eles fiquem juntos para sempre. Mas o final dessa história só pode ser definida por eles próprios, que vivem hoje isolados mas felizes. Não que eu, que escrevo essa história possa julgá-los, já que meus pais viveram assim por todo o tempo depois de terem filhos. E foram felizes até que a morte os separasse.

Desafio dos 30 Dias - Cão Morto

Eu até comecei a escrever a história ontem, mas acabei me distraindo com um cachecol que estou quase terminando. Quem me conhece um pouco pessoalmente sabe que eu tenho e tive muitos cães. A história de hoje poderia ser a respeito de qualquer um deles. No entanto escolhi reescrever uma história que li em um livro que minha avó me deu quando eu ainda era criança. Será reescrita com minhas palavras, num ponto de vista diferente do que a história original foi, mas basicamente é a mesma história. Se alguém se interessar, posso procurar o livro e acharo título da história original, mas prefiro que não. Logo vocês vão entender porquê.

Vivíamos em um lugar muito pobre. Éramos em 6, minha mãe, eu e meus irmãos. Lembro que um dia fomos resgatados. E aos poucos, cada um de nós foi sendo adotado. Foi triste ser separado de minha mãe, mas o homem que me adotou era bom e cuidava bem de mim. Me dava comida, água e atenção. Às vezes até passeava comigo no parque. Nos dias que ele não me levava, eu ia sozinho. Ele não me mantinha numa coleira, então podia ir e voltar pra onde quisesse. Uma vez, num dia chuvoso, quase me perdi. Foi pelo cheiro dele que consegui voltar pra casa.
Um tempo passou e lembro que meu dono passou a parecer mais preocupado, mais triste. Me levava pra passear com mais frequência e tinha pego o habito de fumar. Odiava o cheiro. Em um de nossos passeios ele me levou na casa de um amigo. Disse que tinha que se mudar. Que precisava de um novo dono pra mim. Que era sua única opção. O amigo não pareceu se importar. E fui deixado ali.
Meu novo dono tinha uns hábitos estranhos. Sempre que eu me aproximava, ele parecia ficar mais irritado. Eu me aproximava mesmo assim. Ele não me fazia carinho, mas eu o recebia com alegria mesmo assim. Água e comida ele nunca deixava faltar, mas nunca me levou para um passeio.
Por esse motivo, fiquei feliz quando ele colocou uma coleira no meu pescoço pela primeira vez. Ao contrário do meu antigo dono, eu não tinha muitas chances de ir pra rua, então fiquei feliz e saltitante. Fomos até a praia. Ele me colocou em um pequeno barco e começou a remar. Estávamos bem longe da praia quando ele me pegou no colo. Foi a primeira vez que ele me pegou no colo, e foi uma sensação muito boa. Então ele desajeitadamente me jogou na água. A corrente que usava no pescoço se enroscou na minha pata e acabou caindo comigo no mar. Mergulhei para pegá-la, mas quando voltei à superfície, percebi que o barco não estava mais no mesmo lugar. Ele estava indo embora. Comecei a nadar, mas o mar estava revolto, era difícil nadar. Com a corrente presa em meus dentes, acabava bebendo muita água salgada. A sensação era horrível, mas precisava alcançá-lo.
Cheguei na praia exausto. Mas só encontrei o barco. Ele não estava mais lá. E tinha começado a chover. Eu não gostava de chuva. Me apressei como pude para não perder o rastro do cheiro dele. Farejei meu caminho de volta. Mas estava tão cansado...
Quando cheguei de volta para casa, raspei a porta com as forças que me restavam. Não demorou muito para ele abrir a porta. Estava ficando difícil de respirar. Então, caminhei com as forças que me restavam até seus pés, onde me deitei e respirei aliviado. Tinha trazido a corrente de volta. E estava em casa. Podia descansar.

sábado, 21 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - O que você sabe?

História de hoje tá mais pra um desabafo, mas vai ser assim mesmo. Já era pra eu estar dormindo, mas aqui estou eu... escrevendo. Se você ler isso, pelo menos deixe um comentário dizendo que me apoia. Eu estou precisando.

Lembro de quando você me pediu em namoro. Eu disse que apenas um pedido era o suficiente, mas você quis me dar um anel. Foi com carinho que aceitei e me dediquei ao nosso compromisso. Nosso, pois era o que as alianças significavam. No entanto, o que você sabe de relacionamentos?
Fui sua primeira namorada. Antes de mim, você me disse ter gostado apenas de uma outra garota que, com o passar do tempo, você passou a odiar pelas atitudes que ela tinha. Me pergunto então se, por um acaso, você também passou a me odiar.
Você sempre me diz que espera mudanças, no entanto, quando pergunto o que devia mudar, suas respostas variam entre "nada precisa mudar" e "não sei. Inclusive, sua razão favorita para dar desculpas ou respostas é essa, o saber. Ou você não sabe ou quer saber. E sempre me machuca no processo. Mas imagino que você também não saiba disso. Se soubesse, pq insistiria em fazer isso? Não quero acreditar que você me machucaria intencionalmente.
Desde que engatamos um relacionamento, você pediu pra terminar comigo 4 vezes. Na primeira continuamos nos vendo e acabamos voltando um mês depois. Na segunda você disse que haviam duas opções, que eram a de continuar com você do jeito que você estava ou terminar. Eu preferi continuar com vc, pois você tinha me dado uma opção. Na terceira vez, até eu estava cansada, então quis dar um tempo. No entanto, o tempo não durou uma semana, e acabei voltando pra você. Porque é isso que eu faço. Na quarta vez você simplesmente disse que queria conversar no dia do casamento, sem nem se importar com os resultados que suas atitudes teriam em todas as pessoas presentes. São sua família. Era um evento importante. E você queria terminar comigo no meio daquilo. Como você teria feito se eu não tivesse perguntado antes? E se era pra realmente terminar, pq você não foi definitivo quando te perguntei? Porque tudo que você me responde tem que ser baseado em um não sei? Por que você está terminando comigo? Nada disso faz sentido pra mim. Me pergunto se faz pra você.
Então você me diz que eu tenho que seguir com a minha vida, que é o que você está tentando fazer, que eu não sei como você está se sentindo, que você nunca demonstrou. Então me mostre! Ao invés de fugir mostre que tudo que fiz por você não foi em vão, não foi tempo perdido, não foi dinheiro perdido, não foram sonhos perdidos. Sonhos que nem existiam mais, pois você se encarregou muito bem de alimentar e matar cada um deles durante o tempo em que estivemos juntos. É como se você quisesse que eles doessem mais quando fossem extintos. É como se tudo que você quisesse desde o início fosse chegar a esse dia derradeiro de dor. Pra mim. Pois eu sei o que estou sentindo. Será que você sabe?
Por muito tempo usei sua idade de desculpa pra aceitar tudo. É uma fase. Cada emprego que você conseguiu foi uma fase de querer desistir de tudo. Não passar no vestibular foi outra fase. Pra tudo, provavelmente a desculpa era eu. Não eram as horas e horas gastas na frente do computador que eu te dei pra que você pudesse jogar, já que eu não jogava mais. E por que não jogava mais? Porque você fez com que eu me afastasse de uma por uma das pessoas todas. Porque você fez com que eu me sentisse mal até mesmo de jogar jogos sozinha, pois não percebia suas mensagens e depois você fazia questão de fazer com que eu me sentisse mal e culpada por isso.
Nesse exato momento te pergunto se você sabe o que está perdendo. Se faz ideia da mulher incrível que está jogando no lixo, por puro capricho. Eu pensei que finalmente poderíamos nos ver mais, ter um pouco mais de felicidade. Ah, como eu estava errada. Você v ai seguir seu caminho. Eu vou seguir o meu. Se te ver de novo, vou te pedir sua aliança de volta. Houve uma vez que quis te devolver e você não aceitou. Você tem razão. Esse relacionamento é meu. O compromisso é meu. Fui tudo eu, desde o início. Então me devolva. Devolva o símbolo que você carrega de tudo que me foi bom e que você está tirando de mim. E siga sua vida, como me disse pra fazer. Mas saiba que, da mesma forma que não esperei por outros, não vou esperar por você. Se é pra que eu siga em frente, eu vou seguir de cabeça erguida, com todas as cicatrizes que esse relacionamento me deixou. Sou uma guerreira que luta pelo amor e pela justiça. Vai doer e vou sofrer. Mas vai passar. Já perdi a pesoa que me deu a vida, que era a pessoa mais importante da minha vida. Com certeza vou sobreviver a você também. Vai sangrar e vou chorar. Mas vai passar. Pra mim e pra você. Espero que você seja feliz da próxima vez que resolver se relacionar, mas por favor, pense bem antes de propor coisas que não pode cumprir. Pense bem antes de partir outro coração. Pense bem antes de machucar outra pessoa.
Lembro que, bem no início, não te levava a sério. Você gosta de meter isso na minha cara. Eu pensava que você é muito novo. Eu só seria uma ponte pra que você encontrasse algo melhor. Teria sido melhor se não tivéssemos tido nada sério, pois teríamos evitado muitas dessas coisas. No fim, eu só servi pra isso mesmo, ser uma ponte. Não sei se te levei pra algo melhor, mas espero que seja lá qual for o motivo que te levou a tomar as decisões que tomou, que valha a pena. Vá em frente. Siga com sua vida. Encontre felicidade. Me esqueça se for preciso. Eu não vou nem mais tentar falar com você. Vou facilitar o seu seguir com a vida. E vou construir meu caminho sobre minhas lágrimas. O que você sabe, afinal?

sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Médico Rato

Agora, para a história de hoje... O que? Vocês acharam que eu ia pular? Eu poderia, mas o tema é interessante e já tenho uma pessoa em mente. Vamos começar!

Quando era mais novo, ele gostava de uma menina que eu conhecia e odiava. Gostou dela por dois anos ou mais, quando finalmente teve uma chance. Um mês depois, terminaram. Lembro de ter pensado na importância que ela tinha na vida dele. Dois anos se foram por água abaixo após um mero mês de namoro. Não era amor, era uma paixonite. A garota era importante pra ele, mas perdeu a importância quando finalmente se tornou algo mais. Às vezes se tornar algo mais para os outros é um problema.
Não muito tempo depois soube que sua mãe estava com câncer e que era incurável. Minha avó também tinha morrido de câncer e eu também já tinha perdido minha mãe quando a dele faleceu, mas não pude dar nenhum tipo de apoio ou conforto para ele. Não nos falávamos muito na época. Mas soube que ele passou a morar com a avó. Motivos familiares que não cabem aqui, pois seria doloroso e revoltante de mencionar. Mas sei que ele mergulhou de cabeça nos estudos. Seu sonho era ser médico.
Vez ou outra combinava com ele de assistir algum anime juntos. Era bom, pois ele não desistia no meio do caminho. Muito pelo contrário, ele avançava até onde eu tinha parado e, de lá, continuávamos juntos. Ele, mesmo estudando, se esforçava da forma dele, e isso era bom. Mas ele estudava demais. Estudava e estudava, sem parar. Comecei a me preocupar dele se tornar uma daquelas pessoas bitoladas com algo ao ponto de esquecer da vida. Era algo que eu admirava mas que ao mesmo tempo me assustava. Eu nunca tinha conseguido ser uma dessas pessoas totalmente dedicadas a uma única coisa. Se teve algo assim na minha vida, se perdeu. Várias e várias vezes. Mas não é de mim que estamos falando!
Queria ser médico. Brincávamos que ele era a pessoa perfeita para ser médico, pois não se importava muito com ninguém, não se apegava muito a coisa alguma. Características ideais para médicos. No meu trabalho conheci um médico que, para mim, é o espelho de como ele vai ser. Um médico eficiente nas medicações e nos tratamentos, mas que não olha muito pra cara do paciente, pelo simples fato de tudo que ele precisa estar ali, escrito na ficha de atendimento. E por conta disso, ele vai ouvir muitas reclamações do tipo "ele nem olhou na minha cara". Torço pra que ele não tenha também a característica de tratar mal os idosos. Não é que o médico que conheço faça isso, mas as pessoas mais idosas, em especial, reclamam do tratamento recebido por ele. Talvez um pouco por idosos terem uma necessidade maior de atenção. Pessoas doentes em geral precisam de atenção. Então, meu amigo, se estiver lendo, quero que saiba que você tem um grande futuro pela frente e que eu torço muito pelo seu sucesso. Quero muito que se torne médico. Dos bons. E que se os pacientes tiverem que reclamar de você, que seja, também, de você não olhar na cara deles, e não de você ter errado a medicação. Que você tenha um futuro brilhante e que seja feliz. E que eu possa ainda ser sua amiga pra ver tudo isso acontecendo. Digo isso pois sei como é difícil manter contato com os outros quando começamos a trabalhar. Tenho medo de quando todos os meus amigos estiverem trabalhando, pois sinto que vou perder uma boa porção da minha felicidade, mas espero que cada um, à sua maneira, também encontre algo que te mova e que te traga felicidade. Eu, também, vou começar uma busca por algo que me faça feliz de verdade.

Desafio dos 30 Dias - Uma Lua Solitária

Historinha estilo livro infantil, porque eu quero. Essa era pra ser a história de ontem, mas vai ser a de hoje. Só aceitem. 

Quando olho pro céu, vejo uma bola redonda que insiste em mudar de forma de tempos em tempos.
Um dia, parece um sorriso. No outro, parece uma bola. Às vezes, tenho que procurar bem pra achar seu contorno no céu. É como se estivesse tentando se esconder.
Mas do que está se escondendo?
Quando ela está grande e brilhante lá no céu, parece um rosto sorrindo pra mim. E eu sorrio de volta. Ela é tão bonita que dá vontade de tocar.
Mas ela está tão longe.
Via as estrelas no céu e pensava que estavam lá pra fazer companhia pra ela. Mas um dia, na escola, minha professora explicou que na verdade a lua está muito perto da Terra e que as estrelas eram, na verdade, como o sol, só que muito, muito distantes. Isso me deixou triste, mas logo me conformei. Ela não estava tão sozinha assim, se a Terra estava por perto.
Mas ainda não consigo te alcançar.
Ouvi falar na escola que já tiveram pessoas que pisaram na lua. Eram chamados astronautas. Quero ser um astronauta também! Pra poder pisar na lua. Vou me mudar pra lá. Assim ela não vai mais ter que ficar lá, sozinha, no meio do céu.

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Muito Tempo Longe

Quando falamos em muito tempo longe, podemos pensar apenas em um tempo longo. No caso de hoje, vou escrever sobre um tempo que pode não parecer tão longo, mas que com certeza é longe. Longe de quem a gente ama.

O que é muito tempo pra você? Dez anos? Um ano? Um mês? Um dia? Dependendo de quem for, até mesmo algumas horas podem parecer uma eternidade. É assim que me sinto quando penso na minha mãe. Algumas horas era totalmente suportável. Três anos parece uma eternidade.
Algumas perdas você aceita. Quando você viveu tanto quanto eu, você aceita que algumas pessoas vão passar pela sua vida e servir de ponte para algo melhor. Elas vão te lapidar, e você vai estar melhor preparado para uma pessoa que apareça no seu futuro. Outras pessoas vão passar na sua vida para serem lapidadas. É bom ter noção que algumas pessoas, por mais bem quistas que sejam, uma hora ou outra vão te abandonar. Se a realidade é essa, você pode desistir delas. Pode preferir não se envolver. Ou pode mergulhar e se arriscar.
Eu sou o tipo de pessoa que mergulho. Perdi pessoas no decorrer dos anos que dava por garatidas pelo resto da vida e que descobri, da pior forma, que não era bem assim. Perdi pessoas de uma forma que nunca mais vou revê-las nessa vida, e isso dói. Dói demais saber que você já amou alguém ao ponto de desistir de sua própria vida por ela. E descobrir, quando a perdeu, que existem outras coisas no mundo que vão te ajudar a seguir adiante. 
A vida me tirou minha avó, a única de que eu tenho lembranças. Doeu. Ela também me tirou minha mãe, por quem eu já tinha decidido desistir de tudo para viver por ela. As pessoas não fazem ideia da dificuldade que é tomar essa decisão. Eu perdi amores que não eram amores. Perdi amores que acreditava serem para sempre num piscar de olhos, sem motivo real ou aparente para acontecer. Perdi amigos que acreditava se importarem comigo.
Mas também ganhei. Ganhei força e resistência. Ganhei cicatrizes. Ganhei dor. Ganhei um punhado de poucas pessoas com quem realmente posso contar quando preciso. Ganhei um ombro onde posso chorar o quanto preciso até me sentir melhor. Melhor o suficiente para ir em uma festa de casamento, preparada para terminar um relacionamento e não chorar para não estragar a comemoração dos noivos. Ganhei pessoas que eu vou acreditar até o último dia da minha vida que são maravilhosas, mesmo que não as veja tanto quanto gostaria.
Tenho certeza que meia dúzia de pessoas que lessem isso se reconheceriam nessas linhas. Tenho também certeza absoluta que, dessa meia dúzia de pessoas, nenhuma leria. Tenho certeza que, se fosse uma pessoa normal, já teria desistido de muita gente. Ainda assim, sou eu. E eu não costumo desistir dos outros se os outros não me fazem acreditar que não há esperança. Talvez outras pessoas leiam essa parte e achem injusto, mas é a realidade. Estou cansada de ser a única pessoa que corre atrás. Num mundo onde todos estão ocupados demais com suas vidas, eu ainda tento colocar um pouco de alegria na vida dos outros, não só na minha.

terça-feira, 17 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - O Horror Final

A história de hoje vai ser uma situação real, com pessoas reais e pensamentos que não foram ditos. Divirtam-se!
Era um dia de trabalho comum na nossa agência. Todos estavam em seus computadores e notebooks, ligando para empresas, anotando valores, ouvindo música em seus fones de ouvido, conversando sobre amenidades, reclamando do calor. Sim, estava calor. Era uma época horrível, de fato, pois não tínhamos ar condicionado. Só ventiladores que e ram distribuídos pela agência em locais estratégicos pra que, supostamente, ninguém sentisse calor. Eu tinha meu próprio ventilador de mesa, alimentado por um cabo USB que eu colocava no notebook. O único defeito que ele tinha era quando eu o colocava muito alto e ele ficava na altura dos meus olhos. Eles ficavam secos e ardiam. Mas era melhor que sentir calor.
Naquele dia, especificamente, tinham passado inseticida por toda a agência, na esperança de se livrarem um pouco dos insetos. Foi quando apareceu uma barata. A comoção foi enorme. Um dos rapazes pegou o inseticida e tentou usar nela, mas a cada borrifada, se afastava com medo dela vir pra cima dele. Nossa chefe pegou o inseticida das mãos dele, dizendo "não é assim, deixa eu te mostrar como se faz!" Não adiantou, pois ela também tinha medo de baratas, e acabou passando pelo mesmo vexame. Já tinha uma das meninas que tinha se trancado no banheiro, na esperança de que a barata não fosse praqueles lados. quando notei, ela estava passando por perto de onde eu estava. A barata, não a garota. Essa continuava no banheiro. Me levantei, andei até ela lentamente e dei um pisão. Daqueles bons. A barata explodiu debaixo do meu pé; gosma saiu pelos lados dela e as pessoas que, até aquele momento, estavam em pânico, passaram a ter nojo.
-Por que você fez isso?
"Porque prefiro um bando de gente enojada do que um bando de gente berrando nas minhas orelhas por causa de uma mera barata".
Obviamente eu apenas pensei essa última parte. Mas não me arrependi nem um pouco. A fonte de todo o mal (?) tinha sido eliminada e todos puderam voltar a viver em paz... assim que o corpo da barata foi devidamente removido.

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Correção

Hoje vou contar algumas histórias sobre o período escolar e como algumas coisas marcam a vida das pessoas.

Lembro de quando era menor e mais inteligente. É engraçado como, com o passar do tempo, emburrecemos. Mas na época de escola, eu costumava ser a criança mais brilhante que tinha. Uma vez nosso professor de português fez um ditado e propôs como atividade que trocássemos nossos ditados com o coleguinha, que devia corrigir nosso ditado. Corrigiram o meu reescrevendo todas as palavras, como se "letra feia" fosse um erro. A minha letra nunca foi bonita, confesso, mas eu não tinha cometido tantos erros. Minhas palavras estavam a lápis enquanto a menina que corrigiu meu ditado escreveu com caneta por cima, logo, quando reclamei com o professor da injustiça, ele nem fez nada. Também lembro da única nota vermelha que tive em meu boletim. Tinha trocado de sala e, justamente no primeiro dia de aula naquela sala, tive uma prova de história. Infelizmente história não é algo que você simplesmente sabe. A não ser que seus pais te contem a história do mundo pra dormir, coisa que eu duvido que algum pai em todo o mundo faça. Aprendi que, com aquela professora, o negócio era decorar as perguntas e responder as que caiam na prova pra, logo em seguida, esquecer. Saia da prova e, quando meus colegas perguntavam "o que você respondeu na questão tal?" minha resposta sempre era algo como "nem sei". Eu realmente esquecia. Gosto de histórias, mas a história do mundo não é meu forte.
Também lembro de uma época em que tinha uma professora de educação artística que nons dava atividades super bacanas. Lembro que, com ela, fiz coisas desde desenhar meu colega de trás, bordar um tapete, fazer uma pintura impressionista até treinar uma dança para apresentar para a sala. Na contra mão, tive um professor de educação física que, para balancear as aulas que eu não fazia, passava trabalhos de avaliação onde eu tinha que escrever sobre algum esporte. Era interessante também, pois eu tinha que pesquisar coisas como as regras do jogo, onde tinha surgido, as evoluções que haviam ocorrido, etcetera.
Outra coisa que aconteceu que me marcou muito foi em um ano que minha professora de matemática gostava de passar lição de casa. Eu ia, fazia e esperava pela correção na próxima aula. Uma vez lembro de ter emprestado meu caderno para alguém copiar as respostas. Houve uma época em que eu não fazia isso, mas pouco tempo antes uma amiga minha me disse que a burrice do outro significava melhores chances para mim no futuro. Aquilo me fez mudar minha visão e passei a ser mais liberal quanto às minhas respostas. Naquele dia específico eu tinha errado uma das respostas. E notei que toda a sala estava apagando a resposta errada para copiar a correta. Posso até estar errada mas, para mim, ficou a impressão de que todos da sala copiaram a resposta de mim. Não sei se ficou claro pra mais alguém além de mim, mas é algo que me lembro e que me diverte.
Já na faculdade, me lembro de uma prova que, sem estudar nem nada, tirei um nove. A professora disse que eu devia ter estudado muito para conseguir aquela nota e eu, inocente e burra que fui, disse que não tinha estudado. Nenhuma das outras provas foi fácil como aquela, mas não tive dificuldades de passar na matéria em questão.

domingo, 15 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - A Puta está Morta

A história de hoje é um pedaço de passado. Contado do jeitinho que me lembro, mesmo que seja doloroso lembrar.

Quando comecei a jogar jogos online, percebi uma coisa peculiar: os homens são burros e facilmente manipuláveis. Meu primeiro personagem era uma arqueira que podia se tornar uma caçadora ou uma odalisca. Minha ideia era ser uma caçadora, pois tinha uma amiga que também era, mas conheci um bardo que era muito legal comigo e que falou que, se eu me tornasse uma odalisca, poderíamos dançar duetos juntos. Parecia maravilhoso, então me tornei uma. Pouco tempo depois, casamos nossos personagens. E pouco depois disso, ele sumiu. Eu era do tipo que gostava fácil. Homens? Eu os tinha aos montes. Não foi uma perda tão grande que ele sumisse. Quando ele apareceu de novo sugeriu que nos divorciassemos, pois era uma maldade que eu continuasse casada com ele sendo que ele não ia mais jogar. Foi o que ele fez, e pouco tempo depois eu recebi várias propostas de casamento. Um amigo, que também era um dos meus homens na época, disse que eu não podia me casar, pois eu era popular e que sempre teria pelo menos meia dúzia de homens chorando por eu não ter casado com eles. A verdade é que ainda hoje existem pessoas daquela época que me abordam dizendo que eu devia ter me casado com eles. Faz parecer que teria mudado algo.
Tinha homens de todos os tipos, de todos os cantos do planeta. Homens que amavam minha personagem, minha personalidade, mas que não sabiam nada de quem eu era. Me tornei um pouco mulher por causa deles. Como um outro amigo diz, muita porra foi derramada por mim. E é verdade. Não sei se me orgulho disso. Eu gostava da minha personagem pois ela era amada de um jeito que eu nunca tinha sido. Até que o conheci.
Ele pertencia à mesma guilda que eu, mas não nos falávamos muito. Começou num dia que estava passando por uma das cidades mais movimentadas do jogo e o vi conversando com o líder de nossa guilda, e ele me chamou para me juntar a eles. A conversa continuou mais um pouco até que nosso líder teve que sair para um compromisso da vida real e nos deixou lá, sozinhos. Continuamos conversando, mas de outro tema: ele estava triste. Segundo ele, tinha visto a namorada beijando outro homem em uma balada, e aquilo o machucou bastante. Tinham terminado e ele estava sofrendo. Começava a acreditar que as mulheres não prestavam. Perguntei o motivo e ele me contou outra história, uma sobre como ele tinha feito a namorada de um amigo lhe chupar, enquanto outros amigos gravavam, para mostrar ao amigo como ela não prestava. O tiro saiu pela culatra, e o amigo preferiu virar as costas para os amigos e continuar com a namorada. Não sei que final teve essa história, mas sei o final que a minha vai ter. Falei que tinha um pouco de inveja da mulher, por ela poder ter chupado ele. O que eu queria dizer é que eu estava morrendo de vontade de fazer sexo, de perder a virgindade. Estava ficando velha e muitas das minhas amigas já tinham casado e até mesmo tido filhos. Estava me sentindo pra trás. Não era uma disputa, mas eu estava me sentindo mal por não conseguir nada na minha vida amorosa. Na minha vida amorosa da vida real, que fique bem claro. Mas ele entendeu que era sobre ele, e ficou lisonjeado. E quis fazer sexo virtual. Ele não era virgem, mas era a primeira vez que ele fazia pela internet, então pediu que eu fosse gentil. Eu, pelo contrário, tinha muita experiência no virtual e nenhuma na vida real. Nos demos bem de primeira. E começamos a ficar juntos o tempo todo. Existia uma diferença de fuso horário, pois ele morava na Alemanha, mas dávamos um jeito. Não brigávamos, não discutíamos, ele estava sempre do meu lado. Eu não precisava mais procurar conforto e satisfação em outros homens. Um dia, no entanto, o encontrei triste. Ele começou a me contar sobre o avô dele, que estava muito mal. Me contou histórias do avô dele, sobre como ele tinha lutado na segunda guerra mundial e até mesmo recebido medalhas, que depois foram tomadas dele. Lembro de como ele não acreditava em Deus, então eu, em seu lugar, rezei pra que Deus fizesse o melhor para ele, fosse curar ou poupar da dor. Não passaram muitos dias e ele me contou que o avô tinha falecido. E sumiu.
Passou quase um mês daquela forma e eu comecei a sentir falta do que ele me supria. Acabei caindo na besteira de fazer de novo. Não passaram muitos dias depois disso e ele apareceu. Estava ansiosa e angustiada, pois por mais que ele tivesse voltado, ele não falava comigo, não me procurava. Então resolvi tomar a dianteira e perguntar como ficaríamos. Não ficaríamos, foi a resposta dele. Perguntei o que tinha feito de errado e ele disse que não tinha feito nada de errado. Não era uma questão de certo ou errado, e sim uma questão de fim. "Algumas coisas chegam ao fim", ele disse, "e nós era uma delas". Aquelas palavras atingiram em cheio alguma coisa aqui dentro de mim. Doeu. Chorei muito. Falava sem parar. Queria entender.
Foi em um desses episódios de falar para por pra fora que minha amiga me perguntou se eu estava prestando atenção no que eu estava dizendo. Nunca fui uma pessoa de pensar antes de falar, muito menos de perceber o que estava falando, então, quando ela perguntou, eu respondi com toda a sinceridade que não, não tinha prestado atençã no que tinha dito. Nem fazia ideia do que tinha acabado de falar. E ela me disse pra passar a prestar, pois eu mesma tinha dado a resposta para meus problemas. Tive que insistir com ela um pouco sobre como realmente não lembrava do que tinha dito para que ela fizesse o favor de repetir, da forma dela, o que eu tinha dito que supostamente resolveria meus problemas. Eu tinha vivido por muito tempo pulando de galho em galho, muitas vezes em mais de um galho ao mesmo tempo, e naquele momento, que tinha realmente encontrado alguém que fazia a diferença na minha vida, não estava mais com vontade de pular pro próximo galho, pois queria continuar pra sempre com aquele.
Ali foi um divisor de águas na minha vida. Acredito com todas as minhas forças que as pessoas que passam pela nossa vida não passam simplesmente por passar. Não, elas deixam algo delas em nós, e nós com certeza deixamos algo de nós nelas. Naquele dia, meu lado que sentia necessidade de estar sempre gostando de alguém, sempre pulando em galhos, levou um tombo, pois tinha resolvido se agarrar a um galho que tinha se partido, sem estar se segurando em nenhum outro. Eu caí, e essa queda me trouxe de volta pra realidade. Literalmente.
Parei de jogar aquele jogo. Parei de procurar pessoas para satisfazer meu apetite. Passei a gostar de apenas uma pessoa por vez. Não era do tipo que esperava muito pra me confessar, pois estava lidando com a vida real, e na vida real eu sou apenas uma gordinha normal. Ninguém gostava de mim da mesma forma. Eu sou uma pessoa maravilhosa demais para se ter como amiga, então os homens não queriam arriscar perder isso para ter algo a mais. Era triste, mas era como funcionava, e eu estava acostumada com isso. Aquela parte de mim morreu, e estou honestamente feliz com isso. É um lado de mim de que não me orgulho, mas que fui eu, e não posso fechar os olhos ou fingir que não aconteceu. Fico feliz de ter passado. Fico feliz que hoje sou uma pessoa fiel. Só me falta uma pessoa que esteja realmente disposta a viver pro resto da vida comigo. Infelizmente essa não é uma opção para os homens modernos, mas é um sonho que tenho, e se não posso me agarrar a um galho, me agarrarei a esse sonho. Até que se torne realidade.

sábado, 14 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - O Caixão

A história de hoje não foi escrita por mim, confesso, mas sim pelo meu colega de trabalho, o Luciano, que viu o título e resolveu escrever. Achei interessante e gostei da história, então, aproveitando que meu cérebro estava fundindo hoje, resolvi aceitar a história dele. Espero que não se importem, e que apreciem o esforço dele.

Um certo dia de sol , no qual nem tudo estava dando certo da devida forma em que eu esperava, uma onda de calor avassaladora fez com que minha querida avó, na época com 76 anos de idade, fosse parar no hospital por insolação. Fiquei com medo e e bem triste , pois ela estava bem animada porque iria receber  sua compra que fez pela primeira vez através da internet. Infelizmente não pude acompanhá-la no hospital, uma vez que eu só tinha 13 anos de idade. Naquele dia todas as coisas que me deixavam aflito estavam acontecendo, e portanto o meu medo estava cada vez mais potencializado. Naquele dia eu não desgrudei do telefone, passeia a tarde toda esperando, aguardando uma ligação de minha mãe para dar notícias sobre minha avó. Eis que toca a campainha lá de baixo e meu pai, que estava comigo em casa, corre para atender. Eu fiquei estático sem nem me importar com o que se tratava. De repente, não mais que de repente, toca o telefone : TRIIIIIIIIIN, TRIIIIIN...  Sim, era minha mãe ligando para dar notícias de minha vovó. Novamente corre meu pai, no entanto agora para o telefone. Eu ansioso por uma boa informação, fiquei caladinho atrás da porta da sala ouvindo minuciosamente as falas do meu pai, uma vez que eu ja sabia o quanto ele gostava de privacidade para falar ao telefone. Num momento específico da conversa, meu pai diz para minha mãe que já sabia que não seria como o esperado, pois se tratava de uma idosa . Naquele momento me arrepiei dos pés a cabeça. Mesmo sem saber do que estavam falando, comecei a ficar nervoso. Senti minha temperatura subindo de vez. E as falas desagradáveis de meu pai não pararam por aí, ele disse em um tom mais exaltado o seguinte para minha mãe no telefone.
-Eu já esperava que não desse certo. Agora não sei o que farei com o 'caixão'. Sabia que pior estava por vir.
Naquele instante, uma generosa lágrima caiu dos meus olhos. Corri em direção ao meu quarto e me pus a chorar no canto da cama como um alguém que acabara de perder sua razão de viver. Estava inconsolável. Só me restava chorar. Como não existe nada tão ruim que não possa ficar pior, entra meu pai  no quarto.
-Filho, me ajude a colocar aquele caixão de sua avó lá na garagem? Está muito pesado.
Já era o fim pra mim, mas pensei. Eis minha ultima chance de retribuir as coisas que ela fez por mim. Meu pai me olhou com uma cara de surpreso e indagou.
-Por que estás a chorar como um alguém sem amor ?
E antes que eu fosse capaz de emitir minha resposta, toca a campainha e ouço minha mãe a chamar. Aquele calafrio me deixou tonto, mas encarei. Quando cheguei na sala não pude acreditar no que meus olhos viam. Exatamente, minha avó aparentemente saudável e andando. Meu  sorriso foi tão espontâneo e longo que quase rasguei minha boca. Não estava entendendo nada  e, quando fui questionar meu pai a respeito  ele me explicou que não passou de um mau entendido por parte minha. Ele me esclareceu que "O caixão" ao qual se referia  na realidade era o pacote da encomenda que minha avó teria comprado pela internet, e que sua insatisfação era referente ao tamanho do pacote, pois estávamos falando de uma lavadora de roupas de 16 quilos. O alívio foi imediato, foi como a cura de um câncer. Daquele dia em diante passei a perceber quão importante era a vida da minha avó para mim, sobre tudo que não devo escutar e/ou me apropriar de informações inconsistentes antecipadamente, sem que haja veracidade comprovada. E para minha avó sobraram abraços e " eu te amo".

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Quem sou eu?

Pronto, pronto, passou... Vamos esquecer de ontem e viver o hoje. Hoje é o futuro de ontem, mas não pensemos no amanhã. Vamos viver o hoje. Vou lhes contar uma história mais leve dessa vez... Baseada em trechos de um filme que assisti, mas não lembro o nome nem de tudo, então ela vai ser assim também, em trechos.

Quando abri meus olhos vi uma mulher deitada ao meu lado. Ela parecia familiar, mas não conseguia me lembrar de quem era.
-Por Deus, será que bebi ontem à noite?
Sabia da minha fraqueza para o álcool e o evitava, mas vez por outra acaba vítima de um inocente bombom de licor. Meus colegas de trabalho achavam engraçada essa brincadeira até que um dia eu passei realmente mal e apaguei. Me levaram para o hospital e ainda levaram uma bronca do médico. Achei foi bem feito. Estava divagando ainda sobre os efeitos do álcool em mim quando percebi que a mulher tinha acordado e estava olhando pra mim, com um sorriso afetuoso.
-Bom dia amor.
"Amor"!? Não estava indo muito rápido? Nem a conhecia. Abri a boca para reclamar mas não consegui dizer nada. Percebi que tinha um pequeno montinho entre nós, debaixo das cobertas, se mexendo.
-Bom dia!
A pequena parecia uma versão miniatura da mulher que estava deitada ao meu lado.
-O que foi papai? Parece que viu um fantasma.
-Seu pai deve estar com sono, deixe ele descansar mais um pouco. Vou preparar o café.
Pai? As coisas estavam realmente indo por um rumo que eu não entendia. A pequena veio me abraçar, mas a detive.
-Um instante, preciso ir no banheiro.
Onde era o banheiro? Parecia minha casa, mas também parecia diferente. Arrisquei ir no cômodo que costumava ser o banheiro na minha casa e fiquei feliz de ver que tinha acertado. Fui até a pia e lavei o rosto. Quando olhei para meu reflexo no espelho notei várias rugas a mais e vários cabelos brancos que não tinha. Era eu, mas não exatamente eu. Me via naquele rosto mas não o reconhecia como eu mesmo. Ouvi uma batida na porta e imaginei que fosse a mulher.
-Já vou.
Tinha que tomar muito cuidado com o que fazia, com o que dizia, com aquelas duas pessoas que estavam na minha casa. Quem eram? O que estavam fazendo ali. Tinha que descobrir, mas como? Desci para a cozinha e estranhei todas as mudanças na casa. Realmente parecia que as duas estavam morando ali fazia algum tempo, pois minha sala agora parecia um pequeno playground, cheio de brinquedos espalhados pelo chão. Acho que a pequena deve ter notado, pois se desculpou e correu para juntar os brinquedos.
-Faça isso depois de tomar café Alice.
Alice! Ótimo, tinha o nome de uma delas pelo menos.
-Tudo bem, eu ajudo. Assim terminamos mais rápido.
A mulher me olhou, espantada.
-Tá bom, vou terminar de preparar as torradas!
Me abaixei e comecei a ajudar a pequena, que parecia extremamente feliz com a ideia de eu estar ajudando. Pelo menos foi o que me pareceu. Já sabia seu nome, mas como entrar no assunto?


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Ela estava aos prantos.
-Você parece outra pessoa!
Ela não estava lá tão errada. 
-Me desculpe. Eu não sei como explicar.
-Você nem está tentando! Não está me dizendo nada! Parece a época em que nos conhecemos, que eu tinha que ficar te cutucando pra que você me falasse as coisas. Eu não quero voltar naquela época, então se está passando por algum problema, me diga. Podemos passar por isso juntos, como fizemos por todos esses anos.
Ela estava segurando minha mão enquanto dizia isso, mas não me olhava. Parecia estar se acalmando, mas ainda chorava. Coloquei minha mão em seu ombro e a trouxe para mais perto de mim. Ela não se segurou. Me abraçou e começou a chorar mais ainda.
-Desculpa, vou sujar seu terno.
Ela tentou se desvencilhar dos meus braços, mas não permiti. A abracei mais forte.
-Tudo bem, depois eu mando lavar.


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A segurava com uma mão, na outra, levava o cão na coleira. Quando chegamos no parque, soltei os dois. Correram alguns metros. Alice se jogava em cima dele e ele rolava na grama. Algo dentro de mim fez com que eu corresse até eles e me jogasse na grama também. Minhas costas doeram um pouco, mas me sentia feliz.
-Você voltou!
Estava tão distraído que não percebi quando Alice segurou meu rosto entre suas pequenas mãozinhas. E sem perceber, sorri mais.
-Sim, eu voltei.
Abracei Alice e passei aquele dia com ela e o cão no parque. Em casa, carreguei Lisa para o nosso quarto e, pela primeira vez desde que toda essa loucura começou, fiz amor com minha esposa. 
Quando acordei no dia seguinte, estava sozinho na cama. Me espreguicei e desci as escadas até a cozinha. Tinha algo errado. Não encontrei nem Lisa, nem Alice, nem Bethoven. A casa estava extremamente limpa e a decoração era de quando eu estava solteiro. Corri para o banheiro e me olhei no espelho. Me vi exatamente como me lembrava. Mas me sentia vazio. Liguei para o trabalho e disse que ia faltar. Motivos de saúde. Já sabia onde encontrar Lisa, mas não fazia ideia de como iria explicar tudo para ela. E, mesmo que explicasse, não havia garantia nenhuma de que ela entenderia. Afinal, fazia tanto tempo que não nos víamos que era capaz dela nem me reconhecer mais. No entanto, valia a pena arriscar. Depois daqueles dias que vivi, sentia que era impossível viver mais um dia que fossem sem elas.

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Zona Final

A história de hoje vai ser pesada, estejam avisados. Estamos em setembro, o amarelo, o contra a depressão, o contra o suicídio. Vamos nos suicidar juntos? Se quiserem, podem colocar de fundo uma trilha sonora também: Goo Goo Dolls - Black Balloon

-O que eu fiz de errado?
-Você não fez nada de errado.
-Então por quê?
-Algumas coisas chegam ao fim. "Nós" é uma delas.
Acordei ofegante, com lágrimas nos olhos. Eu era uma daquelas pessoas românticas, que namoravam pensando em casar. Meu primeiro namoro não tinha dado certo pois eu era jovem, curiosa e infiel. Confesso. Terminamos por não um, mas vários erros meus. Segundo ele, a confiança tinha se quebrado. Eu o amava, mas não conseguia mudar aquela característica. Aquela pequena característica. Era como se procurasse nas pessoas um conforto para algo, que nunca encontrava. Na verdade, nunca encontrei.
Meu segundo namorado era o tipo carinhoso e atencioso. Abria a porta do carro pra mim, me levava pra sair, me dava presentes, me trazia flores. O namorado ideal. Nunca brigamos, nem sequer uma discussão. Se algum problema surgia, sentávamos e conversávamos. E resolvíamos. Naquele dia não foi diferente. Sem gritos, sem violência. Ele não me beijou, apenas afagou meus cabelos e se foi. Por várias vezes pensei em ir atrás dele, mas não tinha coragem. Foi uma mudança sutil e quase ninguém percebeu, mas comecei a me isolar. Ainda postava fotos nas redes sociais e interagia com os amigos pela internet. Só pela internet. Se me chamavam para sair, dava uma desculpa para não ir. Ninguém percebeu que minhas fotos eram todas tiradas em casa. Ninguém percebeu a maquiagem cobrindo as olheiras. Nem o piso cheio das coisas que eu usava e tinha preguiça de guardar. Algo dentro de mim havia se partido.
Não faziam muitos dias que o tinha visto. Tinha saído pra comprar comida no mercado e o vi com outra mulher. Ela era linda e ele sorria. Me escondi por um instante, pensando que estava vendo algo proibido. Então senti raiva. Aquele homem era meu. Pensei em ir até ele, tomar seu braço e arrastá-lo pra longe comigo. Fugir, sim! Podíamos fugir pra bem longe e ficar juntos de novo. Tudo ficaria bem. Tudo estava bem. Eu nem queria terminar, pra começo de conversa. Mas ele colocou o braço por cima dos ombros dela e andaram juntos até o caixa. Continuei olhando enquanto passavam as compras, pagavam a conta, embalavam os produtos. Sorriam e conversavam. Pareciam genuinamente felizes. Me agachei, abracei os joelhos e comecei a chorar, ali mesmo. Se alguém me viu, não disse nada. Desisti das compras e voltei pra casa, arrasada. O que tinha se partido tinha, naquele momento, se estilhaçado. Realmente, não tinha mais volta. E nenhum outro caminho para onde ir.
Pesquisei algumas formas comuns pelas quais as pessoas se matam. Banheira? Muito sangue. Comprimidos? Alguém podia me achar, me levar pra um hospital e minha tentativa seria em vão. Afogamento? Eu sabia nadar, as chances de dar errado eram fortes. Enforcamento? Devia doer. Se jogar?
É, parecia que eu tinha encontrado minha forma. Só precisava de um lugar alto o bastante. Com movimento o bastante. Se a altura não me matasse primeiro, com certeza algum carro iria. Olhei no calendário. Meu aniversário se aproximava. Sabia de algumas pessoas que gostariam de comemorar comigo, então sugeri de irmos a um restaurante bem caro que ficava no terraço de um hotel famoso. Juntei minhas economias. Convidei todas as pessoas que podia e que não podia, inclusive meus ex-namorados. Comi do bom e do melhor, bebi do vinho mais caro, ri e tirei fotos. Qualquer um que perguntasse diria que eu estava ótima, que nunca imaginaria. Mas não eram eles que tinham imaginado, e sim eu.
Quando todos estavam bêbados demais ou distraídos demais para darem conta, andei até a beirada e subi. Me virei e me surpreendi por um instante. Lá estava ele, olhando para mim, com os olhos esbugalhados. Vi como se fosse em câmera lenta. Ele se levantou enquanto eu dei um passo para trás. Esticou o braço enquanto seu corpo se projetava para frente, enquanto meu corpo começou a cair. Fechei os olhos e senti as lágrimas escorrerem. A sensação era boa, não haviam arrependimentos. Era mesmo o fim.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Nuvens Escuras Como Chumbo

A história de hoje vai ser apenas uma história. De chuva e de como me lembro das chuvas da minha infância. Espero que gostem.

Quando eu era pequena os dias eram menos quentes e mais amenos. O sol não parecia nos queimar a pele. Nossas mães nos aconselhavam a sair de casa com um agasalho todas as manhãs pois sabiam que, de manhã e de tarde, ia esfriar. Haviam mais terrenos e menos casas. E nos finais de ano, as chuvas de verão. 
Me lembro como se fosse hoje de quantas e quantas vezes ficávamos sem luz e tínhamos que ligar o lampião a gás e as velas pela casa. Era uma época em que comíamos à luz de vela sem nem imaginar que aquilo era, supostamente, romântico. Dava pra ver a chuva pela porta da sala e o brilho dos relâmpagos pela janela. Não me assustava com eles, eram os trovões que me assustavam. O som alto e claro, parecia que o céu estava zangado com alguma coisa. Mas adorava o som da chuva. Me ajudava a dormir.
Me lembro que conforme crescia e ia ganhando mais imaginação, passei a dizer que a chuva era São Pedro lavando o céu, pois tinha o azar de sempre estar na rua sem um guarda-chuva quando começava a chover. Não era um problema pra mim, mas para as pessoas ao meu redor era. Eu já era uma mocinha, e as roupas de uniforme escolar insistem nas blusas brancas, então algumas coisas quer não deviam ser vistas ficavam bem expostas. Só que eu era inocente e não entendia. Até percebia as pessoas olhando, mas não fazia a menor ideia do porque olhavam. Levaram mais alguns muitos anos para eu entender.
Hoje em dia chove pouco e, quando chove, as pessoas reclamam, como se a chuva fosse uma maldição. Os dias são mais quentes e as pessoas vestem roupas cada vez mais curtas. Talvez para elas seja mais confortável mas eu sinto falta dos meus agasalhos feito à mão pela minha vózinha. Sinto falta dos dias chuvosos gastos em casa, quando eu não tinha problemas nem amores nem responsabilidades. Hoje, se quero matar a saudade das chuvas, tenho que procurar sites que tenham o som da chuva e ficar ouvindo. Não é a mesma coisa, mas já mata a saudade. A única coisa que não posso emular é o cheiro da chuva. É verdade que, quando eu era criança, nunca tinha percebido o cheiro da chuva e agora que sou adulta, consigo. Queria poder sentir naquela época, pois é um cheiro que hoje posso dizer que gosto muito.

terça-feira, 10 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Despertar

Hoje vou escrever uma história mais leve e suave. Outra fanfic, dessa vez sobre Ragnarok Online. Espero que gostem!

Eu estava dentro de um ovo quando me dei conta de mim pela primeira vez. Ouvia vozes distantes gritando coisas que não compreendia, até que fui parar em duas mãos. Mãos gentis, que me seguraram com firmeza. Algumas palavras foram proferidas e senti algo quente dentro de mim. Quando abri meus olhos pela primeira vez, vi um rosto se iluminar na minha frente. Essa se tornaria minha maior motivação para continuar em frente, não importando as dificuldades no caminho.
-Você é uma gracinha!
A voz dela não soava como os gritos que estava acostumado a ouvir. Eu nem sabia direito o que era uma gracinha, mas ela falou com tanto amor que eu não consegui evitar de me sentir bem com aquilo. Descobri mais tarde que minha dona raramente dizia palavras de ódio, apesar de se chatear mais do que eu gostaria. Raramente ela chorava também. Quando ela estava triste eu costumava me aproximar dela de maneira sutil. Logo ela me abraçava e começava a afagar minha cabeça. Era uma das melhores sensações, mas eu não conseguia me alegrar. Pelo contrário, meu peito doía. Queria que ela voltasse a sorrir aquele mesmo sorriso.
Às vezes ela me instruiu a ajudar em combate. No início, era complicado. Eu errava bastante e ela tinha que compensar minhas falhas. No entanto, nunca me repreendeu. Pelo contrário, me dava comida, água e carinho na medida certa, nem demais, nem de menos. Não tinha do que reclamar.
Depois de um tempo, percebi que seu semblante parecia preocupado com frequência. Começamos a frequentar alguns lugares mais perigosos e ela já não me instruiu a ajudar no combate, pelo contrário, eu devia fugir de monstros caso eles resolvessem se tornar agressivos e me atacar. E naqueles lugares, todos eles eram. Ficamos por lá um bom tempo e ela parecia sempre cansada, mas determinada. Descobri depois de um tempo que ela buscava algo. Uma pedra. Não entendi no início porque sua fixação por ela, mas descobri que era por mim.
-Talvez você se sinta desconfortável - ela começou, titubeante - mas vai dar tudo certo, e você vai ficar bem, eu prometo.
Ela realizou o ritual necessário e, mais uma vez, senti meu corpo se encher de calor. Quando o processo terminou, eu vi de novo. Aquele mesmo sorriso. Corri em direção a ela e ela me recebeu de braços abertos. Estava maior, me sentia mais forte e decidi que, daquele momento em diante, faria todo o possível para protegê-la. E para ver aquele sorriso que eu tanto amava.

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Desafio dos 30 Dias - O Pai

Quase esqueci de hoje de novo! A história de hoje vai ser baseada em uma ideia que eu tive para uma fanfic que estava escrevendo mas que parei. Talvez, quando tudo isso acabar, eu volte a escrever aquela fanfic. Hoje, no entanto, trago para vocês o que chamo de background dos personagens Lilian e Philip, dois irmãos que tiveram que se separar para conseguir resistir. São personagens principais de um dos vários jogos de Harvest Moon. Espero que gostem!

Era uma noite chuvosa e fria. Eu abraçava Lilian em meus braços enquanto ela tapava os ouvidos. Dava para ouvir os gritos vindos da cozinha, o estalo de um tapa, os passos que corriam para o quarto e os que seguiam, incertos, enquanto a pessoa que produzia os passos se escorava na parede para não cair.
-Volte aqui, agora!
Ele tentou abrir a porta do quarto e não conseguiu. Foi só quando ouvi os passos continuando que lembrei que não tinha trancado a porta do nosso quarto. Me repreendi e carreguei Lilian até o armário.
-Fique escondida aí, não saia até eu dizer que está tudo bem!
Ela só acenou com a cabeça. Fechei a porta e me preparei para o que estava por vir. A porta se abriu. A mão grande e pesada de meu pai me agarrou pela camisa e sem resistir, apanhei. Apanhei no lugar da minha mãe e da minha irmã. Quando ele finalmente parou, mais por estar bêbado demais para continuar do que por qualquer coisa, Lilian abriu a porta do armário.
-Eu te disse para esperar.
Antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, Lilian pegou minha mão e começou a chorar. Me ajudou a levantar e me carregou, da forma que pode, para fora de casa. Sentamos na varanda e ficamos observando a chuva. Eu pelo menos fiquei. Lilian deve ter saído em algum momento sem eu perceber, pois da mesma forma que não percebi sua saída, não percebi que tinha voltado até que ela encostou um pano úmido no meu lábio inferior. Ardeu. Ela afastou o pano, um pouco assustada, mas logo continuou limpando os machucados.
-Pode me avisar se começar a doer.
Acenei que sim com a cabeça e deixei que ela continuasse. O som da chuva era tranquilizador. Não queria pensar em nada, mas algo perturbador passava pela minha mente. Queria acabar com aquilo, e logo. Nossa mãe não aguentou muito tempo mais e nos abandonou. Cansado de apanhar, arrumei duas pequenas malas, uma para mim e uma para Lilian, e a levei para a casa de parentes. Eles não fizeram perguntas, mas foram bem claros que só poderiam abrigar um de nós.
-Tudo bem, cuidem da Lilian. Eu consigo me virar.
Lembro até hoje de como ela segurou minha mão e chorou. Como naquele dia chuvoso. Foi com dor no coração que me despedi dela com um abraço e parti para a cidade. Lá havia todo tipo de trabalho, mesmo que fosse para uma pessoa jovem como eu. Com certeza eu conseguiria arrumar algo. Talvez até conseguisse sobrar um pouco para mandar pra Lilian às vezes. Uma vez consegui economizar o suficiente para lhe mandar um presente de aniversário, mas ela me escreveu uma carta. "Prefiro que me mande cartas para saber como você está do que receber um presente". Não me arrependia do que tinha feito.
Passaram anos até o da que o vi de novo. Achava que talvez estivesse morto, mas não, ali estava ele. Parecia outro homem, bem vestido, segurando uma outra mulher pela mão e uma pequena criança no colo. Pensei em me aproximar e alertar sobre o perigo que aquele homem  representava, no entanto, ele olhou para a criança e sorriu. E seu sorriso era como o de Lilian, quando eu ainda conseguia vê-la sorrindo. Cerrei os pulsos e virei as costas. Que direito ele tinha de recomeçar, depois de tudo que tínhamos passado? Pelo menos Lilian estava a salvo e nunca mais teria que ter medo. Naquele dia, escrevi uma carta e pedi que ela me mandasse uma foto. Sorrindo. Eu aguentaria qualquer coisa, contanto que ela pudesse ser feliz.