sábado, 25 de fevereiro de 2017

Memórias Que Só Eu Tenho

Ano passado, no aniversário da filha da minha amiga, estávamos conversando e, ao ver minha reação, o marido dela estranhou. Ela, por sua vez, disse que sempre fui assim. "Ela imagina as coisas na cabeça dela e tem essas reações engraçadas". Foi a primeira vez que pensei que essa "habilidade", que eu achava inerente a todos os humanos, é, de fato, minha. Não digo que eu seja a única pessoa no mundo que tem essa habilidade, com certeza devem haver mais, no entanto percebi que não é algo que, como eu esperava antes, todos fizessem. Isso nos leva ao título deste post.
Existem momentos em que aquela pessoa que me é especial e querida tem vontade de falar. É raro, mas às vezes acontece. É normal que eu preste atenção quando ele me fala algo pois sempre tento não cometer os mesmos erros. Se tivesse que usar a definição da Magliani, é o medo de incomodar. Se tivesse que usar a minha definição, é meu medo de cometer os mesmos erros e ser punida da mesma forma que anteriormente. De uma forma ou de outra, é ruim, mas não é aqui que quero chegar. Na última vez que conversamos ele estava reclamando de uma amiga dele. A verdade é que não conheço todos os amigos dele pessoalmente mas, pelo que ele fala, com algumas características consigo reconhecer alguns deles. Uma dessas pessoas é exatamente a amiga de que ele estava falando. Já ouvi histórias de como ela age ao redor dele que me fizeram ter a certeza que, se algum dia fossemos apresentadas, ela iria me humilhar muito. Não que fosse algo consciente, pois percebi indo à terapia que às vezes fazemos certas coisas sem nos darmos conta de que estamos. No entanto, ela com certeza iria usar os fatos que ela tem (e que são muitos) contra mim. Eles são amigos de infância, ela o conhece bem. Já ouvi dele sobre uma conversa que teve com ela onde ela estava dizendo não ter certeza se estava feliz com o namorado e que achava que tinha que tentar com outra pessoa, sendo que ele mesmo se prontificou para a tarefa. Soube de como ele, ela e mais um amigo que eles têm em comum tiveram dificuldades em achar um motel que aceitasse uma suruba e alguns detalhes desnecessários da suruba em si. Para alguém que imagina as coisas como eu, doeu imaginar aquilo. A última história foi de como a amiga conseguiu, de forma articulada, transformar uma espera por alguém que estava tomando banho em um motivo perfeito para causar ciúmes na hoje ex-namorada dele.
Neste momento algumas pessoas podem me questionar, por que eu imagino se é algo que vai ser doloroso? Eu não controlo isso, por isso achava ser uma característica inerente ao ser humano. Se alguém me falar que um amigo quebrou o braço eu já vou imaginar o braço quebrado e, dependendo dos detalhes e da profundidade da história, sou capaz até mesmo de sentir um formigamento na parte que imagino que foi quebrada. No meu corpo. É quase como se eu pudesse sentir a dor. É como se eu estivesse lá, vendo acontecer. São essas as lembranças que só eu tenho, pois não é a realidade, ainda assim elas têm uma forma na minha mente. Não são apenas palavras que formam uma frase que vai se perder em algum lugar do meu cérebro no limbo do esquecimento. São cenas que podem não ser fiéis à realidade mas que, ainda assim, se formam na minha mente, criando um cenário, uma sensação, um sentimento.
Nesta quinta, como ele estava falando dela, eu criei coragem pra falar dela pra ele, no entanto meu ônibus estava pra sair e ele deu a opção de "desenrolar esse assunto amanhã". Quando o questionei no início da conversa por que tinham vezes que ele queria conversar comigo e tinham vezes que não ele se justificou dizendo que estava bêbado. Ele já fugiu de mim enquanto estava bêbado também, então não foi uma boa desculpa, mas eu vou deixar passar. Não é como se eu tivesse muitas opções do que fazer de qualquer forma. No entanto ontem, o dia que supostamente iríamos desenrolar a conversa, não consegui iniciar o assunto e, apesar de termos ficado conversando por umas 2 horas, ele se foi. E eu tive que mandar mensagem pro Whatsapp dele. E falei que, para mim, ela é uma pessoa possessiva. Falei de como, se nós nos conhecêssemos, ela faria questão de mostrar como o conhece há mais tempo, como o entende. Com certeza ela também mostraria como eles têm uma relação profunda e como ele se importa com ela. Ela me parece ser aquela pessoa que, para manter a pessoa que ama (mesmo que, nesse caso, seja como amigo) por perto, faria qualquer coisa. E isso me assusta. Eu não sei como iria lidar com ela. E nada me tira da cabeça que ela perceberia que eu gosto dele e usaria todas as armas que tem para me afastar dele. Pois ela pode arrumar um namorado e deixar ele lá, de lado, até precisar dele novamente. Ele não. Ele tem que estar disponível pra ela quando ela precisar. Um estalo de dedos e ele estará lá, pois ele é esse tipo de pessoa. Com ela.
Como um adendo que nada tem a ver com a relação dele e dela mas tem tudo a ver com o título do post, devo dizer que ontem ele tirou algumas fotos minhas com meu celular e disse para eu vê-las. Não o fiz até que chegasse em casa. E acabei gostando de algumas delas. A verdade é que sempre odeio minhas fotos pois não me acho fotogênica. No entanto gostei delas o suficiente para trocar minha foto de perfil no Facebook. Ele foi o primeiro a dar Like. E ainda fez um comentário de como fotos espontâneas são as melhores. Lembrei de como sempre gosto de fotos minhas em que não estou olhando para a câmera, meus amigos gostam muito de fazer isso às vezes, então comentei sobre isso, sobre eu não olhar pra câmera ajudar. Então ele respondeu dizendo que eu estava linda. Foi a primeira vez que ele me elogiou nesse sentido. E confesso que agradeci por ser apenas um post no Facebook pois se fosse pessoalmente eu provavelmente ficaria vermelha e ficaria sem reação. Mesmo ler o "linda" no Facebook me deixou sem reação. Por que ele tem que fazer essas coisas só agora, que está para ir embora? E por que eu não consigo fazer nada além de ver ele partir? Será que as coisas tem que ser assim mesmo? Será que tudo que eu posso fazer é ficar quieta e ver ele ir embora, sem dizer nem fazer nada?

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Meu Eu Gamer - RPG

Fazem alguns dias que percebi como faz tempo que tenho jogado RPG "de mesa". A primeira vez que tive uma experiência dessas foi em São Paulo, jogando numa pequena mesa num grupo de 4 jogadores mais um mestre. Na vez seguinte, estávamos em dois e um mestre. E a campanha não teve continuidade por conta da dificuldade de movimentação de todos os envolvidos.
Depois disso meu amigo Gilson se animou de fazer uma campanha ambientada no Brasil indígena. Campanha de um único dia, que resultou em eu querendo também fazer uma campanha ambientada no Japão Feudal. Só que eu nunca tinha mestrado, podia ter sido melhor. De qualquer forma, todas as experiências foram gratificantes. As reais que aconteceram até então.
Houve uma época em que eu tinha um relacionamento muito amigável com um garoto chamado Gabriel. Foi ele que nos introduziu no RPG de mesa "online". Basicamente arrumamos fichas, um grupo e começamos a jogar nos fins de semana. Acontece que ele cansou de mestrar e perguntou se o Henri não gostaria de tomar o lugar dele como mestre. Então arrumamos mais pessoas para o grupo e recomeçamos do zero, uma nova aventura, com novos personagens e um novo mestre. O próprio Gabriel se interessou e, durante um tempo, jogou conosco. "Em chamas!" era uma frase muito comum que ele dizia, mesmo que sua espada ainda não estivesse enfeitiçada. Tínhamos um bom grupo, com o Bárbaro furtivo, um meio orc Clérigo, o Paladino que abandonou o grupo para enviar uma pedra amaldiçoada para um grupo de pessoas que supostamente poderiam fazer algo a respeito, uma Barda encrenqueira, um Bardo novato e um Ladrão que aparecia e desaparecia de acordo com sua vontade. O Silver por várias vezes se animava de jogar mas nunca o fazia de fato. Trocamos do formato 3.5 para o 5 na última sessão e ele mais uma vez se animou de começar, no entanto quando perguntei para ele certa vez porque ele se animava mas, na hora de jogar, ele sumia, ele explicou que não gosta de ter compromissos fixos. Já tinha dito pra ele que não existe obrigatoriedade em ele estar conosco todo o tempo e que ele poderia fazer um personagem para aparecer às vezes, mas acho que ele realmente não tem vontade suficiente. Afinal, existem várias outras coisas que ele pode fazer ao invés de jogar RPG.
A verdade é que todos nós temos várias outras coisas que podíamos estar fazendo ao invés de jogar RPG. Começamos uma nova campanha pelo simples fato que todas as pessoas que jogavam conosco foram perdendo o interesse. Doeu naquele momento ouvir o Henri dizer que, se eles perderam o interesse, a culpa era dele. A verdade é que a vida cobra de todos nós as nossas responsabilidades e eu, diferente da maioria deles, não tenho tantas obrigações e responsabilidades. Nosso RPG resiste com duas pessoas. Desta vez, variando de tudo que sempre fiz, sou uma druida. É interessante pois quando jogávamos baseado no 3.5 eu usava duas lâminas para lutar. Agora com a versão 5 sou mais caster que qualquer coisa. O que ainda assim é inusitado, pois meus personagens sempre usaram armas de longo alcance. É divertido experimentar coisas novas e, esse ano, no anime friends, caso tenham mesas de RPG lá, pretendo me juntar a uma delas. Só mais um dia.
Uma das melhores coisas de jogar RPG com o Henri é que ele é um mestre esforçado. Temos um mapa Mundi além de mapas locais para quando vamos lutar ou para cidades que temos que visitar. Temos NPCs que já foram usados de outras aventuras que, quando encontramos de novo, tenho que lembrar que esse novo personagem não os conhece e agir de acordo, mesmo que meu coração esteja feliz por vê-los novamente. É bom também ouvir menções aleatórias do nosso outro grupo, pois apesar de ser outra campanha em outra parte do mundo, é o mesmo mundo e as coisas que acontecem em outros lugares importa.
Domingo é o dia que jogávamos. Quando as pessoas estavam perdendo o interesse eu até questionei se, talvez, uma mudança de dia ajudaria de alguma forma. Já que não foi o caso, continuamos jogando de domingo. Somos dois jogadores e um mestre. Não acredito que dessa vez precisamos de muitos jogadores pois temos nossas almas. Longa história resumida, nossos personagens, por serem casters, tiveram suas almas roubadas deles. Personagens que tinham algum tipo de busca se tornaram nossas almas temporárias e agora nos ajudam a lutar para que possamos recuperar nossas almas de fato. Penso que comparativamente, é como Fate onde heróis ajudam seus mestres na busca pelo Graal. Tenho várias idéias do que pode vir a acontecer, apesar de saber que vai levar um bom tempo até que as coisas importantes aconteçam de fato. Sem contar no caos psicológico de minha personagem. Acho que é um defeito meu, coloco personalidade demais nos meus personagens e acabo sentindo junto com eles. Faerydae é uma personagem tocada-pelas-fadas, criada por dríades onde, de fato, apenas duas delas lhe eram próximas pois todas as outras a consideram indigna de estar lá. E quando as dríades começaram a ficar doentes e morrer, ela foi trancafiada pelo simples fato de acharem que era ela a responsável pela doença das dríades. Por não acharem nada contra ela, a soltaram e a mandaram em uma jornada atrás do druida do inverno. Essa era a missão inicial de Fae, mas nas últimas sessões encontramos o druida do inverno. Recuperamos uma relíquia apesar de deixarmos um demônio fugir. Agora Fae tem que voltar para sua terra e avisar a dríade Druida da Primavera que haverá uma reunião dos druidas ali mesmo, em Brookilen. Já vejo minha pobre personagem quebrando a cabeça em como entrar em Brookilen com seus companheiros de viagem, já que qualquer criatura que não seja uma dríade não pode entrar na floresta.
Confesso que Fae não é minha personagem favorita, gostava muito mais de Ellyjobel, minha gnominha fofa. Mas as circunstâncias não me permitiram continuar com ela. Posso vir a usá-la em outra aventura, em outro mundo, em outra campanha, mas não será o mesmo grupo, não será a mesma Elly, não será o mesmo mestre. Tenho que aceitar os fatos. Muitos personagens virão e sairão da minha vida, mas provavelmente eu não esquecerei de nenhum deles.  É assim que eu sou. Eles constituem um pedaço de mim mesma, de certa forma.

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Cuidando de Si

Desde que minha mãe morreu, muita coisa aconteceu na minha vida. Das mais importantes devo citar minha psicóloga. Tenho muitos amigos e, normalmente, quando comento algo que ela me fez perceber, uma das coisas que eles mais gostam de dizer é "mas eu já tinha te dito isso". Entendo que realmente eles tenham falado de uma forma diferente da que ela usa, e acho que é exatamente por isso que ela me faz tanto efeito. Meus amigos me falam as coisas com intenção de me proteger das coisas ruins do mundo. Eu não quero ser protegida das coisas ruins do mundo pois vivo nesse mundo. Minha mãe já fazia isso, me proteger. E a proteção dela era do tipo sufocante e restritiva. Ainda assim, por ser minha mãe, por ser quem era, eu nunca tentei me livrar das amarras. É aqui que entram várias das coisas que a Magliani me disse.
Ficar sozinha é um dos meus maiores medos, no entanto, tudo que faço é para ficar sozinha. Esse foi o momento de divisão de águas. Saber que tenho que pedir por atenção é difícil pois nunca soube pedir nada. Sempre preferi fazer as coisas sozinha do que ter que depender da ajuda de outros. Sozinha. Depois disso, perceber o tanto de pensamentos negativos que invadem minha mente em um único dia me fez perceber que a pessoa que é mais cruel comigo é ninguém mais ninguém menos que eu mesma. "Se é tão gentil e consoladora com os outros, por que não pode ser com você mesma?"
Minha última realização é como minha impressão de que incomodo os outros é forte e enraizada. Percebi que na verdade não é o simples "incomodar" os outros mas que sim, estou tentando evitar repetir ações que trouxeram resultados negativos em momentos anteriores. Não é só o incomodo que me preocupa mas sim se vou me machucar novamente com a mesma situação. Um erro é um erro, repetir o erro é burrice. Passar pelo mesmo sofrimento parece algo que só alguém masoquista faria. Então minha lição de casa foi escrever uma carta para minha mãe, brigando com ela por tudo que eu conseguisse lembrar. Foi difícil e não consegui fazer a segunda parte (que consistia em ler a carta em voz alta, com tom de briga) até o momento de ir lá vê-la novamente. Lá ela me fez ler a carta. E me fez brigar com minha mãe. Fechar os olhos funcionou muito e consegui sentir a mágoa, a dor e a raiva fluírem. Então Magliani me fez consolar meu eu mais jovem. Me lembrou um pequeno vídeo que eu tinha visto de um seriado chamado My Fat Diary, onde a personagem principal tem vários problemas e era forçada a falar para seu eu mais jovem tudo de ruim que ela dizia para si mesma todos os dias, o que ela não conseguiu fazer. E a pessoinha que me veio à mente foi aquela jovem Luciana com 14 anos que tinha acabado de entrar no Senai, que usava a camisa dentro da calça, mais inocente que qualquer pessoa daquela idade ao ponto de dar dó. A pessoinha que sofreu por amores não correspondidos, que não sabia o q era vaidade nem amor próprio. Aquela pessoa que finalmente se revoltou com a mãe, que finalmente se aproximou do pai. Uma pessoinha complicada e confusa, que não sabia de nada. Não que hoje eu saiba de muita coisa a mais que naquela época, nem que me cuide muito mais do que me cuidava naquela época, mas a verdade é que hoje olho pra trás e consigo ver muitas mudanças em mim. Se foram pra melhor ou pra pior, só o tempo vai dizer. Talvez em algum momento da minha vida as coisas parecem começar a fazer sentido. Talvez não. Mas estou vivendo, isso não é uma escolha, é uma obrigação. Não desci pro playground pra parar no meio da brincadeira.

sábado, 4 de fevereiro de 2017

Catarse

Quando problemas começam a acontecer eles vêm junto de outros problemas. Isso explica aquele ditado "desgraça pouca é bobagem". Poderia exemplificar aqui dizendo que, às vezes, uma pessoa que confie em você coloca mais peso nas suas costas do que você consegue aguentar, inconscientemente. É o que acontece no meu relacionamento com minha chefe. Ou ex-chefe no caso. Eu e ela brigamos várias vezes, no entanto ela conversa comigo de forma bem sincera, ela se preocupa do jeito estranho dela e, às vezes, me fala de suas vontades ou de como ela fez algo que, na minha opinião, é totalmente errado. Minha psicóloga perguntou certa vez "por que ela te conta essas coisas?" e minha resposta honesta foi "não sei". Aliás, minha psicóloga é a pessoa que tem me dado as respostas que preciso já faz algum tempo. Converso com a Lucimar quando estou triste e com problemas mas minha psicóloga é a pessoa que coloca tudo que eu digo em ordem e me aponta o problema, a solução e me questiona, fazendo com que eu pense, com que eu lembre, com que eu reviva. Em minha última conversa com a Lucimar falei de como sempre imagino o que me contam e como eu achava que isso fosse algo natural da raça humana. Ela me confirmou que não é, o que me faz pensar que sou estranha demais. Deve ser por isso que algumas pessoas têm tanta dificuldade de lidar comigo. Sensibilidade demais? Quem poderia dizer?
Já fazem algumas semanas que ouço conversas entre meu supervisor e o Giorgio. Por várias vezes eu achei que eram apenas simulações inofensivas até o belo dia em que Minas Gerais foi mencionada como opção de estudo. Ele realmente quer ir pra lá. E eu entrei em pânico. Desde que comecei a trabalhar no IBGE já sabia que, em algum momento, ele iria partir. Ano passado, pela primeira vez, eu fui realmente pesquisar quando seria e até pensei em tirar férias na semana em que ele sairia para evitar o chororô, pois sei que choraria mais com a saída dele do que com a de qualquer outra pessoa. Então fui surpreendida com a informação de que ele não vai terminar o contrato e que, sim, vai para Minas estudar. No início da informação eu nem tinha uma data de rompimento, o que fez doer ainda mais. Então quarta-feira, o dia da feijoada, ele foi almoçar comigo e com o Jonas, que também é outro que está saindo antes do contrato vencer. Foi quando eu finalmente tive a coragem pra perguntar quando que ele vai. "No fim do mês". Meu coração sentiu um alívio imediato. "Agora tenho um prazo", pensei. Mas esse alívio foi curto quando ouvi uma conversa entre ele e o meu supervisor sobre ele ir semana que vem. E entrei em pânico novamente.
Tenho várias coisas que queria dizer pra ele, desde perguntas que nunca foram respondidas até situações que nunca foram esclarecidas. Queria poder perguntar "posso te tocar?" e poder segurar o rosto dele entre minhas mãos, mesmo sabendo que se eu fizer isso hoje vou chorar muito. Quero poder passar a mão pelo cabelo dele de novo sem pensar que vou estar incomodando. A verdade é que tudo, tudo que eu quero e penso em fazer, meu próprio cérebro bloqueia. Já brigamos e discutimos tanto por tanta coisa que eu instintivamente me proibi de falar sobre vários assuntos, fazer várias coisas, até mesmo ficar perto dele, pelo simples motivo de acreditar com todas as minhas forças que vou estar "incomodando".
Aqui devo fazer uma pausa e fazer uma menção honrosa. Magliani, minha psicóloga querida, me disse que essa sensação de que sempre vou incomodar está muito enraizada em mim e que está me fazendo muito mal, logo temos que trabalhar isso. Ela perguntou de onde eu consigo lembrar dessa sensação ter vindo e a primeira pessoa que me veio à mente foi minha mãe. Ela sempre foi a pessoa que me podou e eu me esforçava ao máximo para não perder o carinho dela, como se fosse de fato perder esse carinho caso falasse com ela sobre meus problemas. Não sei se iria pois, em vida, não tentei. Vou passar por essa vida sem saber como teria sido se eu de fato falasse pra ela tudo que eu passei e senti. E alguns podem perguntar por que diabos estou falando da minha mãe, sendo que esse post parecia ser sobre o Giorgio. Bem, minha psicóloga apontou duas características muito semelhantes de um e de outro: minha dificuldade de lidar com suas atitudes e dizer para eles o que eu penso e sinto. Ela tem toda razão. E isso me fez pensar que amo minha mãe com tal força destrutiva que procuro os pontos complicados dela em outras pessoas, como se resolver esses problemas com as outras pessoas fosse resolver meus problemas com ela. Bem, temos aqui uma prova de que não. Não resolveu com ela e só me criou os mesmos problemas com ele.
Ontem tivemos uma reunião para a troca de chefe. Não consigo me imaginar chamando o Dag de chefe nem a Nadir de... bem, Nadir. Desde que entrei no IBGE só consigo chamar ela de Nadir quando estamos na rua, na agência sempre foi "chefe". Vou ter que me acostumar com isso. Aproveitei a oportunidade e dei uma sugestão para um novo panfleto para as aberturas de setor e fui elogiada pela sugestão. Isso fez com que eu me sentisse bem a ponto de nem falar sobre as bolinhas do DMC. Sim, elas ainda atrapalham, mas não vamos estragar algo bom que eu fiz com uma reclamação mínima como essa. Além disso, também sabemos que sairemos dali logo em breve. Fomos despejados. Vocês pessoas normais acham que são só moradores que atrasam o aluguel? Pois não, lhes apresento os órgãos públicos tendo os mesmos problemas.
Ontem também foi o dia que supostamente eu e o Jonas poderíamos finalmente beber na adega novamente. Já estava sentindo o gosto do vinho na minha boca quando vimos que o lugar ainda estava fechado. Tristeza, mas tudo bem, ainda tem o bar do Jukebox. Giorgio ia nos encontrar lá depois. E não veio só. Lembro do nome do amigo dele e sei pronunciá-lo mas não sei como se escreve, mas fiquei sabendo que ele é uma mistura de índio com árabe. Mistura intrigante. Ele era uma pessoa super bacana e me senti bem à vontade perto dele, como sempre me sinto perto de todos os amigos que o Giorgio me apresentou até agora. Ele tem bons amigos. Bebemos, conversamos, chorei mais do que devia ouvindo músicas do jukebox, uma vez ouvindo love of my life, apesar de ter me controlado bem, e outra ouvindo por ela, que me lembra minha mãe pois ela ouvia Julio Iglesias. Acompanhei os dois até a casa do Giorgio depois de me despedir do Jonas e, lá, aconteceu o que eles dois chamaram de catarse. Eu nem sabia o que era isso, então fui pesquisar no google. O próprio google me deu uma resposta mas vi que a Wikipedia também tinha uma definição, e achei que a parte que fala da catarse na psicanálise explicou muito bem como eu me sinto depois daquela bomba de sentimentos explodindo pra todos os lados. Resumindo, foi um expurgo de tudo que estava preso e, tendo achado um momento adequado de se libertar, o fez. Tipo uma fuga de presos. Tão perigosa quanto pois eu falei muito e falei de coração, sem saber se aquilo ia doer ou se ia colocar qualquer um de nós três numa situação constrangedora. Agora que penso nisso, foi um pouco egoísta da minha parte, mas acabo não me arrependendo. Esgotei todas as minhas lágrimas e toda a angústia que eu estava sentindo saiu. Até consegui dizer as três frases que Magliani me aconselhou a dizer pra ele antes que ele se vá, de acordo com tudo que eu disse pra ela no meio de toda a angústia que eu estava sentindo em nossa última sessão, "vou sentir sua falta", "espero manter contato" e "espero que seja feliz". Girogio me garante que não vai sumir. Me falou se eu não reparei como de uns tempos pra cá ele tem dado mais abertura pra mim. Sim, eu percebi, mas achei que ele estava com dó por saber que eu vou sofrer com a partida dele. Achei que todas as micagens dele pra me fazer rir são um jeito tipicamente giorgiano de me fazer sentir bem pois não conseguimos conversar, e ele queria me fazer sentir melhor de alguma forma. Ele me ler tão bem, de forma tão exata me assustou desde que o conheci. A preocupação dele é quase como um tesouro pra mim pois são poucas as pessoas que se preocupam. Perder ele faz com que eu me sinta triste, mas como disse pra Magliani quando estive lá, "se me perguntarem 1000 vezes se prefiro ele do meu lado ou que ele esteja longe mas feliz, responderei as 1000 vezes que prefiro que ele esteja feliz". Amo aquela risada, aquele sorriso, e faria tudo que eu pudesse para que ele não perdesse isso. Sempre, desde o episódio do teatro, tenho a impressão que eu só faço mal pra ele. "Me afastar é tudo que posso fazer por você". A verdade é que neste exato momento não sei como as coisas vão ficar de agora pra frente. Garanti pra mim mesma que, quando ele não estiver mais aqui, eu vou estar melhor, pois meu cérebro me garante que longe de mim ele vai ser feliz. Não ter que lidar comigo e com meus sentimentos complicados faz com que as pessoas sejam felizes, eu acho. Vou sentir muita falta dele aqui e mesmo que a gente mantenha contato, vou ter aquele mesmo estranhamento que tenho quando converso com a Lucimar por qualquer instrumento online. Existem pessoas que eu prefiro ver, olhar nos olhos, ver o sorriso. Perguntei pra ele se ele faz alguma ideia de como ele é importante pra mim e a resposta dele foi negativa, o que me surpreendeu um pouco. Ele sabe que gosto dele mas não sabia dessa importância. Acho que mantê-lo afastado foi efetivo então. "Sinto que se esticar meu braço posso tocá-lo, mas não o faço". "Quero falar com ele, mas tenho medo de falar tudo que quero dizer, pois sei que isso vai incomodar". Logo mais ele vai embora e todas as coisas não ditas continuarão não ditas. Não vai adiantar eu esticar meu braço e tentar alcançá-lo, pois ele não vai estar ali. Ainda assim, não consigo me esforçar para estar ao lado dele nesse momento. A sensação de que vou incomodar permanece. E por mais que a Magliani tenha a boa vontade de trabalhar isso, leva um tempo pra fazer efeito. Esse vai, eu sei. Existe uma diferença enorme entre o "estar sozinha" e o "me sentir um incômodo". Pelo menos a leveza da catarse vai me ajudar a seguir em frente.