domingo, 13 de outubro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Eu Amo Estação de Agasalho

Hoje o dia foi quente do início ao fim, então fica até difícil escrever sobre frio. Mas vamos tentar!

Todo dia, no caminho da faculdade, eu via aquela senhorinha sentada em uma cadeira de balança do lado de fora de sua casa, com um cesto do lado e duas agulhas na mão. Passava todo o dia lá e, de tardinha, uma ou duas horas antes de escurecer, ela recolhia o cesto e voltava para dentro. Uma moça jovem vinha não muito depois e recolhia a cadeira. Achava a garota linda e queria conversar com ela, mas nunca tinha a oportunidade.
Certo dia, sem perceber, fiquei parado olhando por tempo demais e a senhorinha percebeu. Deu um sorriso e acenou com a mão para que eu me aproximasse. Hesitei, mas fui.
-Qual é seu nome, meu jovem.
-Roberto.
-Roberto! Que nome adorável. Está indo para a escola?
Acenei com a cabeça que sim e ela balançou a cabeça, em sinal de aprovação.
-Então vá e estude bem, meu filho.
Pasava o tempo e tinha a impressão que a senhorinha estava ficando mais frágil, mais fraca, quase como se estivesse minguando. Sabia que não era mal cuidada, mas não consegui evitar de me preocupar. Passei a conversar com ela todos os dias na volta da escola e acabei descobrindo que seu nome era Ana e que a jovem que vinha buscar sua cadeira todos os dias era sua neta, que tinha decidido morar com ela para tomar conta dela. Não tive coragem de perguntar o nome, mas ela chegou a inclusive me mostrar um álbum de fotos. Comecei a lhe trazer frutas que dividia com ela. Percebi que não conseguia comer uma maçã inteira então passei a dividir uma maçã ao meio. Já dizia o ditado, "uma maçã ao dia mantém o doutor longe". Mas não foi seu caso. Na troca de estação, soube que foi internada. Era triste passar na frente de sua casa e não ver nem a cadeira, nem o cesto, nem o movimento das agulhas.
Pensei em fazer uma visita no hospital, mas não sabia em qual ela havia sido internada, entao resolvi parar e perguntar. Levei um susto quando fui recebido pela jovem que admirava. Vestia preto e seus olhos tnham olheiras profundas. Era nítido que estivera chorando.
-Com licença, é que gostaria de visitar a dona Ana e queria saber em que hospital está internada.
Os olhos da jovem se encheram de lágrimas e tive que segurá-la para que não caísse no chão. Ela chorou longamente em meus braços; cada soluço era uma pontada em meu peito. Me preparei para o pior.
-Desculpe, mas minha avó faleceu essa semana. O enterro foi na quarta. Se soubesse que eram próximos, teria te avisado.
Senti meu coração se encher de tristeza. Ela me convidou para tomar uma xícara de chá, mas não quis incomodar. Estava na soleira da porta quando ela perguntou meu nome. Quando respondi, seu semblante mudou.
-Um instante!
Ela correu pra dentro e voltou em um instante com um pacote nas mãos.
-Minha avó estava fazendo isso para você. Estava quase pronto quando ela foi internada. Só costurei as partes e fiz o acabamento. Creio que ela gostaria de ter lhe entregue em mãos, mas... Devido às circunstâncias...
Vi que estava sendo um grande esforço para ela me dizer aquilo entã a abracei, peguei o pacote e lhe dei um beijo na testa.
-Muito obrigado. Vou guardar com carinho.
-Use, por favor! Ela teria gostado mais que usasse.
Acenou para mim e tornou a entrar. Olhei para o pacote em minhas mãos e voltei para casa ansioso, curioso sobre o que seria o pacote. Chegando em casa, abri o embruho e percebi que era um suéter. Ela tinha começado a tricotar as partes pouco depois de termos começado a conversar, eu reconhecia o ponto e as cores. Meus olhos ficaram marejados e cobri o rosto com o suéter.
No dia seguinte, Fiz questão de ir até a casa dela agradecer sua neta. Perguntei seu nome e ela me respondeu que era Carolina. Descobri que sua avó não tinha herdeiros vivos, logo a casa ficaria para ela mesma.
-Vai ser difícil continuar aqui sem ela, mas não tenho outro lugar pra ir.
Foi nesse momento que criei coragem para lhe falar sobre minha admiração. Levou um tempo para que nosso relacionamento mudasse de fato para algo mais romântico e profundo, mas não me arrependi de esperar. Ela se tornou a mãe de meus filhos. Hoje, nos sentamos do lado de fora de nossa casa, cada um em sua cadeira de balanço. Ela coloca um cesto do lado e tricota, enquanto eu leio o jornal. Todo fim de semana, r ecebemos a visita de nossos filhos e netos. E de tempos em tempos, visitamos o túmulo de Ana. Sempre me lembro com carinho daquela senhorinha que, tão gentilmente, dividiu seu tempo comigo, um rapaz que mal sabia o que queria da vida.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Olá Outono

Não é outono. Mas podia ser!

Senti o vento soprando e fechei os olhos. Logo as folhas estariam trocando suas cores de verde para marrom, se desprenderiam de seus galhos e se jogariam de cabeça em uma aventura sem retorno até o chão. Quanta ciência e filosofia envolvida nesse ato tão simples e singelo? O amadurecimento. Deixar o ninho. Aceleração e gravidade. Espirais. Formas geométricas. Sons. Morrer. O fim.
Abri os olhos e me levantei, pronta para encarar um novo dia. Sai para fora e aproveitei para recolher as folhas no jardim. Minha cachorrinha adorava se jogar nas pilhas de folhas. Eu também. Mas este ano não teria ninguém se jogando nas pilhas. Instintivamente fiz uma pilha maior do que devia, que ficou difícil de ensacar. Pensei em acender uma vela mais tarde. Então senti um pingo. Voltei meus olhos para o céu.
Começava a chover. Baixei os olhos e vi uma das vizinhas correndo para pegar as roupas do varal, enquanto outra gritava para os filhos entrarem, ou iriam se molhar. Abri meus braços e fechei meus olhos. Venha chuva! Me lave! Tire de mim toda essa tristeza! Tire de mim toda essa dor! Minhas lágrimas se misturavam com as gotas que caiam em meu rosto e rolavam caminho abaixo. Tudo, invariavelmente, voltaria para a terra, fossem as folhas, a água, minha cachorrinha ou eu. Do pó viemos, ao pó retornaremos.
Fiquei estática por tanto tempo quanto aguentei. Minhas pernas doíam um pouco e meu corpo começava a ficar gelado quando alguém me enrolou em uma toalha.
-Vamos pra dentro querida, ou vai ficar doente.
Não resisti. Os braços gentis me levaram de volta para dentro e me colocaram sentada em uma poltrona próxima à lareira. O fogo estava aceso. Estiquei minhas mãos em direção a ele. O calor fazia com que tivesse a sensação que podia tocá-lo novamente. E se pudesse me unir àquele fogo? Será que sentiria novamente o calor e a felicidade que sentia quando estava com ele?
-Que está fazendo?
Gentilmente tiraram minha mão do fogo. Encarei minha mão, que começava a ficar fria quando colocaram uma xícara nela. Uma xícara quente.
-Tome um pouco, vai te fazer bem.
 Encarei a xícara por alguns instantes e tentei beber. Estava quente, mas não o suficiente para queimar. Era como amor de mãe, quente na medida certa. Não queima ao ponto de te machucar. Não abandona o corpo se este não lhe serve direito. Na medida certa para te acalentar. Era chá. Imaginei que estava tentando me manter calma.
Senti algo felpudo sendo colocado nas minhas costas e me envolvendo. Lembrei dos abraços dele. Uma lágrima começou a rolar em meu rosto. Uma mão gentil afagou minha nuca.
-Quer mais alguma coisa?
Fiz sinal negativo e ouvi seus passos se distanciando de mim. Quis impedir. Tinha sim algo que eu queria. Companhia.
Não me esqueçam! Não me deixem pra trás! Eu estou aqui! Venham me buscar, por favor!
Olhei para fora pela janela. A chuva continuava lá fora. Um vento forte fazia com que o galho de uma das árvores batesse em uma das janelas de um dos quartos do andar de cima. Era assustador. Me encolhi na poltrona e me cobri inteira com o cobertor.
Escuro. Respirei fundo. Percebi que minha respiração estava ofegante. Tentei me acalmar e não consegui. Queria parar. O coração começou a acelerar. Quis gritar, mas minha voz não saia. Abracei os joelhos e chorei. Estava sozinha, mais uma vez. Como todas as vezes. Era o fim de mim. Era o fim de todos nós. Senti meu corpo pesar e deixei que a gravidade o levasse. Não me importava mais.

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Um verão quente

O título original era "Indian Summer", mas eu nunca estive na Índia e não sei qual a diferença das estações lá. Imagino que seja quente, então... Daí a adaptação do título pra facilitar um pouco a escrita dessa história. Espero que gostem!

Quando era pequena não sentia tanto calor no verão. Usávamos roupas mais curtas, mas não me lembro das pessoas expondo todo o corpo na rua como se fosse a coisa mais normal do mundo. Hoje em dia, as pessoas batem no peito e dizem que amam o calor para, quando fica calor, ficarem se lamuriando pelos cantos de como está quente. Quem gosta de calor mesmo é gente que tem ar-condicionado em casa e no trabalho. Não é o meu caso.
Quando fica calor, gosto de me vestir com roupas mais leves. Agora, no entanto, tenho um uniforme de trabalho que tenho que usar. O tecido dele é muito grosso, logo fico sentindo calor do início ao fim do dia. Mas tento não reclamar. Lembro de uma vez que estava frio e vi meu irmão só de camisa e bermuda. Perguntei se ele não estava com frio e sua resposta foi que "eu gosto da sensação do frio". Parei de reclamar do frio, pois apesar de não ser a sensação térmica que eu gosto, posso usar roupas que me deixam quentinha, e isso me agrada. No calor, no entanto, não dá pra sair pelado na rua. E eu definitivamente não consigo me vestir com roupas super decotadas, que mostram todo o corpo. Gostava de usar vestidos, mas com a implementação do uniforme, isso se tornou um pouco mais complicado.
Meu uniforme foi feito para a meia estação. Então, mesmo agora que ainda não é verão, já consigo imaginar como vai ser difícil trabalhar com ele. Tem dias tão quentes que volto pra casa toda queimada, só de ficar uma hora exposta ao sol. Lembro de uma colega de trabalho do meu trabalho anterior que, quando cheguei no trabalho depois de passar dois dias fazendo pesquisas na viela das marmelas, me disse que eu, em dois dias lá, fiquei mais bronzeada que ela se ficasse uma semana na praia. Eu gostava daquele emprego.
Hoje quase não tomo sol. Mas sinto o calor. Odeio o calor, mas não reclamo. Tenho um pouco de raiva daquelas pessoas que dizem amar o calor mas não perdem a oportunidade de reclamar dele. Se gostam, deviam estar felizes com ele, não insatisfeitas e reclamando. É como faço com o frio. Penso às vezes que o ideal seria me mudar para uma parte mais fresca do meu país. Sei que existe, mas não tenho coragem de abandonar o que tenho pra trás. Queria ter um desprendimento maior com tudo isso. Tanto com o tempo, quanto com o lugar e as pessoas.

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Legal e Crocante

Era pra ter postado ontem, mas não consegui. Postando hoje, por questão de consciência.

Quando você pensa em comida, em qual delas pensa? Salgado ou doce? Fruta ou legume? Macio ou crocante? Para algumas pessoas é fácil responder qual a comida preferida. Para outras, a que menos gosta. Para mim, nenhuma delas é fácil de responder. Já experimentei bastante coisa mas também tenho noção de que não conheço vários ingredientes e vários outros sabores. Mas existem coisas que eu sei com certeza que não como. Não misturadas.
Por exemplo, eu adoro amendoim. E castanhas. Não sou tão fã de nozes, mas como. Se você me der um sorvete, eu vou comer ele feliz e contente. Se colocar calda, melhor ainda. Mas não coloque amendoim! O crocante da casquinha combina com o sorvete. O crocante do amendoim, não. Óbvio, essa é só a minha própria opinião.
Não da mesma forma, posso citar a pipoca. Gosto dela com sal, doce ou com pedacinhos de bacon. Mais que isso, pra mim, é exagero. Como a batata frita, que quando vejo perguntarem se quero que coloquem queijo, molho, ketchup, maionese, entre outros, penso que estão desvirtuando a batata.
Uma das dificuldades de se desenvolver gastrite é que você percebe que tem várias restrições e que várias delas incluem coisas que você gosta. Desde frutas e saladas até o molho da lasanha. Tudo se torna um problema, algo a ser observado e cuidado.
Você sabia que tem um jeito certo de mastigar? Pois é. mesmo que a comida seja macia, o ideal é mastigar bem antes de engolir. Ainda estou tentando descobrir como se faz isso com comidas mais líquidas como sorvete e até mesmo suco. Falando em suco, você sabia que seu organismo encara o suco como comida?
O mundo está cheio de comidas, sabores e novidades. Algo que você comeu e não gostou em um momento da vida pode passar a não ser tão ruim em outro. Não estou dizendo que você irá ver aquela comida como sua favorita, mas definitivamente vale a pena tentar de novo, principalmente se for preparado por outra pessoa. A mão do cozinheiro faz toda a diferença. É como o amor. Você não vê, você sente.

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Acampando com Estilo!

O tema de hoje é um pouco difícil. Vamos ver o que eu consigo!

Quando tivemos a ideia estávamos, na verdade, bêbados e amargurados. Assistíamos a TV quando passou uma propaganda com escoteiros mirins. Ela adorava crianças e insistiu que queria visitar um acampamento de escoteiros. Concordei mecanicamente, acreditando que no dia seguinte ela ja teria esquecido. Não foi o caso. Fiz algumas pesquisas sobre acampamentos em geral. Diferente dela, não gostava tanto de crianças. E odiava os jovens com todas as minhas forças. Até encontrar um recanto que parecia o paraíso. Até ofereciam barracas, por uma quantia, é claro. Qualquer coisa pela felicidade dela. Entrei em contato com os gerentes, marquei uma data e avisei minha senhora.
-Mas eu queria ver os escoteiros!
-Foi o que eu consegui, querida.
No dia que antecedia nossa pequena aventura ela se pos a arrumar uma mala. Até uma garrafa de champagne ela separou no isopor.
-Quero que seja memorável!
Colocamos as malas no carro e fomos. O lugar indicado ficava há 2 horas de nossa residência. Ela tirou um cochilo enquanto eu dirigia. Achei impressionante sua habilidade de dormir mesmo enquanto dirigia por uma estrada esburacada. Só acordou quando já estávamos quase chegando. Lá, conseguimos uma barraca próxima ao lago. Nada que um pouco mais de dinheiro não conseguisse pagar. Mas logo fomos sentindo as dificuldades. Insetos haviam aos montes e não nos permitiam nadar no lago. Podíamos pescar mas tivemos que alugar o equipamento. Não demorou muito para percebermos que os peixes não chegavam perto da margem. Tivemos que alugar também um barco e acabei tendo que remar. Nunca tinha feito tanto esforço em minha vida! E ela me observava com um sorriso. Quando chegamos ao meio, me larguei no canto do barco. Acho que cochilei pois quando me dei conta ela estava com a vara em punho. E já tinha pescado dois peixes!
-Vamos voltar pra margem!
Ter que remar de novo me fez gastar todas as forças que eu já nem tinha. Pelo menos ela acendeu uma fogueira e colocou os peixes que pescou para assar. Ela não sabia cozinhar muito bem, então eles ficaram um pouco sem gosto, mas apreciei os esforços. Era bonito ver minha senhora se esforçando para fazer coisas que nunca faríamos no dia a dia.
De noite, quando estava na hora de dormir, resolvemos colocar os sacos de dormir do lado de fora e observar as estrelas. Seria muito romântico se não fossem os pernilongos que não paravam de nos picar e zumbir perto de nossas cabeças. Desistimos das estrelas e resolvemos tentar dormir. Sim, tentar, pois mesmo dentro da barraca estava cheio deles. Comecei a pensar que ficar perto demais do lago tinha sido uma má ideia. Quando finalmente conseguimos pegar no sono, já era quase hora de ir embora. Minha senhora me ofereceu de dirigir de volta para casa e eu aceitei. Estava exausto. Realmente só acordei com sua mão me sacudindo levemente,
-Querido, acorde. Chegamos.
Levaram alguns dias para que as picadas parassem de coçar e suas marcas sumirem de nossos corpos. Apesar de ter sido apenas por um dia, meu corpo tinha uma sensação de moído que não passou por pelo menos dois dias após nosso retorno. Quase consultei um médico para conseguir algum remédio. No entanto, quando olhava para minha senhora, e apesar de todos os incômodos que tinha passado, ela parecia feliz. Logo, me conformei. Mas aprendi a lição e nunca mais concordei em levá-la a algum lugar sem antes pesquisar tudo que realmente era necessário. Se o tivesse feito talvez tivesse trocado o champagne por um frasco de repelente.

quarta-feira, 2 de outubro de 2019

Desafio dos 30 Dias - Outubro Feliz

Novo mês, novo desafio. Dessa vez, dias ímpares serão desenhos que vou postar no instagram e no deviantart. Dias pares serão textos. Que Outubro comece!

Meu mundo desabou em Setembro. E em Outubro, decidi que mudaria minha vida. Procurei médico que pudesse me encaminhar para um alergista para resolver o problema das bolotinhas na minha testa. Também consegui uma guia para tirar uma verruga que eu tenho desde sempre. Nunca me incomodou, mas resolvi que está na hora de tirar. É como se, do nada, tudo que está em mim e me incomoda tivesse que dar lugar para outra coisa. Até transformei a tragédia que foi perder minha carteira em uma oportunidade. Meus documentos mostrariam uma cara nova. Não é que isso, de fato, me mudasse de alguma forma, mas eu queria acreditar que sim.
Nas relações interpessoais, resolvi ser mais discreta. Ainda gostava muito das pessoas, mas sentia que algo tinha se quebrado. Tinha realmente, mas eu não esperava que afetasse tantos campos da minha vida. Agora tinha que me dar menos, que olhar pra dentro. Se estava acostumada a ir comprar nosso café da manhã, resolvi que o faria apenas por mim mesma. Se alguém quisesse algo, que me desse o dinheiro e eu compraria. No máximo dividiria meu leite. E só isso mesmo. As pessoas só lembravam de me oferecer algo quando eu estava em dificuldade. O problema é que eu dificilmente estou nessa posição e não estou acostumada a depender da boa vontade alheia. A boa vontade vem de mim para os outros, não dos outros para mim.
Pensei em criar coragem depois de tirar a verruga e fazer a tríade de estrelas nas pintas que tenho no meu pescoço. Pensei em arrumar vários cursos no Sesc para preencher o tempo livre que eu nem tinha direito. Pensei em me afundar de horas extras no trabalho para ganhar mais dinheiro. Pensei em começar aulas de hidroginástica. Pensei em escrever um livro. Pensei em voltar a ir na psicóloga.
Lembrei de como era bom ir na psicóloga e de como me dava bons conselhos. De como me ajudou a superar a morte da minha mãe, minha paixonite aguda por quem não me queria e minha rebeldia para com minha chefe. Me ajudou a entender que eu não precisava ser feliz o tempo todo, nem carregar os problemas dos outros, muito menos me sentir na obrigação de resolvê-los. Me perguntava o que ela diria para me ajudar na atual fase da minha vida mas não tinha meios de descobrir. Ficaria para mais tarde.
Resolvi que usaria os meios que pudesse pra arrumar o computador do meu irmão e usar ele pra mim. Talvez jogar jogos bons ajudasse também. Então lembrava que tinha que estudar e me formar. Que tinham trabalhos para fazer e matérias para estudar. Que tinham concursos para prestar. Que tinha um futuro todo pra existir da forma que pudesse, e que tinha que dar o meu melhor, mesmo que fosse sozinha. Não podia me dar ao luxo de parar. Nem por ele, nem por ninguém. Nem por mim mesma.