sábado, 25 de novembro de 2017

O Tempo Que Nos Separa

No dia trinta de setembro de mil novecentos e oitenta e cinco nascia uma criança que foi muito, muito desejada e esperada. Os pais dessa criança esperaram um bom tempo até decidirem tentar ter filhos e, quando começaram a tentar, esbarraram em várias dificuldades. O nascimento daquela criança era, por si só, uma vitória para aqueles pais. Ela demorou pra começar a ter cabelo mas, quando o teve, era invejado por conta dos cachos. Tanto que, quando o advento da escola aconteceu, não sendo suficiente que alguma criança maldosa tivesse grudado chiclete nos cabelos dela, ela acabou pegando piolho, o que resultou no jeito mais fácil de combate a essa praga, mesmo que a maioria dos pais relute muito pra fazer isso com sua garotinha: cortou o cabelo curto, como de um menino. Ao ponto que, em uma foto específica, uma garota chegou a perguntar a menina, “quem é essa garoto lindo?” Sua resposta foi “sou eu”. No ano de dois mil a garota completaria quinze anos. Foi o ano em que ela entrou no ensino médio e, também, no ensino técnico do Senai. Numa sala de trinta e dois alunos haviam três mulheres das quais uma era ela. Uma vida inteira convivendo com mulheres e, no entanto, ao começar a estudar naquele lugar e conviver com os homens, ela percebeu que era muito mais confortável viver entre eles. As meninas eram muito dissimuladas, muito atrevidas, muito maduras. Ela, apesar dos seus quinze anos, era não mais que uma garotinha inocente.
Naquele mesmo ano nascia um garoto. Sua vida foi bastante complicada com vários eventos como o divórcio de seus pais, o casamento de sua mãe com um padrasto e a nomadicidade que foi imposta à vida dele para que pudesse estudar e passar algum tempo com sua família. Quando ele completasse quinze anos sua garota estaria completando trinta. Quase uma situação daqueles problemas matemáticos que nossos professores adoram, “Luciana tem o dobro da idade de Henrique. Sabendo que seu irmão, que é onze meses mais novo que ela nasceu no ano de 1986, qual a idade de Luciana? E qual o ano de nascimento de Henrique?” Seria cômico se não fosse trágico. Naquela época, se tivéssemos nos conhecido, provavelmente nunca teríamos chegado onde estamos hoje. Ou talvez teríamos.
Estamos no ano de dois mil e dezessete. Eu tenho trinta e dois anos. Ele tem dezessete. Eu tenho o péssimo costume, desde os tempos do Edgar, de considerar a idade uma justificativa para muitos erros que o outro comete. “Ele é jovem, não sabe o que faz.” Entre outras tantas desculpas que eu dava pra mim mesma. É cômodo quando você quer continuar com alguém que você ignore os erros dela. Ou não. Aprendi que gostar de alguém é aceitar suas qualidades, defeitos e verdades. E é aqui que o tempo correu de forma cruel para nós todos. É verdade que quando estou de TPM me torno uma pessoa insuportável, tenho plena consciência disso. Talvez eu devesse ler alguns livros sobre como evitar esses sintomas. Muita gente diz que esses sintomas são invenção de nossas cabeças. Bem, não sei se é invenção ou não, mas eu percebo que fico mais briguenta. E juro que estou me esforçando pra não ser assim! Existem dias que tudo que eu quero é ficar ali, quietinha. Sozinha. Ou sozinha com meu amor. Acontece que, como era esperado com o passar do tempo, meu amor se sentiu sufocado. Brigamos muito por vários dias. Tivemos discussões bobas e inúteis que começaram a pesar. E durante essa semana ele me pediu um tempo.
Tempo.
A única vez que eu ouvi alguém me contando uma história sobre um tempo em um relacionamento foi minha amiga Liliane quando seu primeiro namorado, por motivos que hoje nem me recordo, pediu para que eles dessem um tempo no relacionamento. A resposta dela, como era de se esperar de uma pessoa com a personalidade forte que ela tem, foi a de que, se era pra que eles dessem um tempo, era melhor que eles terminassem.
Tempo.
E eu entrei em pânico. Eu achava que estava me esforçando por nós dois. Eu ficava com ele por perceber que ele tinha ciúmes quando eu ficava conversando com outras pessoas e, com o tempo, me acostumei a ficar mais com ele do que com os outros. Aos poucos fui me afastando das pessoas, parando de fazer algumas coisas que eu gosto e até mesmo tentar interagir com pessoas que não fossem ele. Isso, obviamente, sufoca uma pessoa além da conta. Eu sei disso. Mas não me dei conta disso, pois não existiam indicadores de que ele estava se sentindo assim. Até que as brigas explodiram e houve o pedido.
Tempo.
Eu me senti perdida. Abandonada. Onde eu tinha errado? Seria aquilo o fim? Ele pediu, de fato, uma semana. Apenas uma semana. Se parar pra pensar, uma semana passa rápido. Mas diga isso pra um coração que dói. Uma semana agindo apenas como amigos, depois de quase seis meses de namoro. Uma semana começou a parecer tempo demais. Minha salvação foi uma Lucimar que me pediu pra ir visitar a casa dela para pegar algumas encomendas que pedi para serem entregues na casa dela, já que eu não confio no carteiro da minha casa. Acabou, inclusive, que o pedido de tempo me foi feito enquanto eu me locomovia da casa dela pro setor. Do setor para casa já estava pensando no que eu ia fazer da vida se ele quisesse terminar comigo. Demorou um tempo até que eu conseguisse digerir a informação e aceitar que, se ele queria uma semana, seria uma semana. Se eu queria ajudar de alguma forma não seria impondo minhas vontades e minha presença que ajudaria. Então comecei a fazer planos de coisas que eu poderia fazer durante aquela semana. Até cogitei a possibilidade de ir assistir o assassinato no expresso oriente sozinha, no dia da estréia, ao invés de esperar o sábado pra ir assistir com ele. No entanto, o tempo destrói mas ele também cura. Não precisou de muito mais do que um dia longe pra ele pedir pra que a gente voltasse do jeito que era, pois ele não tinha pensado em tudo que ele estava perdendo com aquele pedido.
Tempo.

E durante o dia as coisas foram se arrumando e se organizando e agora, neste momento, posso dizer que talvez as coisas ainda estejam um tanto quanto abaladas entre nós, mas vou continuar acreditando que os 15 anos de diferença entre nós, a uma semana de TPM que tenho todos os meses ou o pedido de tempo que durou um dia serão o suficiente para que nosso relacionamento acabe. Desmoronou um pouco? Talvez. Mas da mesma forma que o tempo destrói, o tempo constrói.

sábado, 11 de novembro de 2017

Enem

Pra quem não sabe, semana passada eu fiz a primeira parte da prova do Enem. Isso significa que eu, como a pessoa que tenta ser responsável que sou, vou passar algumas horas do meu domingo numa sala de aula no quinto andar do campus da faculdade Anhanguera, tentando resolver exercícios da tecnologia tanto da ciência quanto da matemática. Não levei o caderno de questões pois honestamente achei que era muito tempo pra ficar esperando, só pra levar a prova. Quando cheguei em casa, meu pai já estava lá. Sim, caso estejam se perguntando, meu pai também fez o Enem. Meu namorado também. E, para minha surpresa, meu chefe também. Cheguei no trabalho comentando sobre o tema da redação que, apesar de eu ter tido uma mãe que era professora, foi bem difícil de desenvolver, pois ela nunca tinha dado aula para surdos. Foi quando meu chefe perguntou onde eu fiz minha prova e comentou onde ele fez a dele. Minha surpresa durou, provavelmente, alguns segundos, até que lembrei o tipo de pessoa estudiosa que ele é. Além dele soube de mais uma pessoa que fez a prova, um amigo de longa data que mora no sul, além da minha amiga Lucimar que nos deu uma carona até o local da prova. Mesmo mal ela foi, pois, segundo ela, existe uma gratuidade para pessoas de baixa renda da qual ela faz parte, no entanto essa gratuidade é perdida caso se falte na prova. Então ela se esforçou bastante pra ir.
Vamos falar da parte de humanas da prova? Vamos!
Pra começo de conversa, me pergunto se alguém esperava aquele tema de redação. O Silver me disse vários temas que podiam ser o da redação e, no entanto, nos surpreenderam com um tema desses. Acredito que pessoas que estudaram em escolas com inclusão devem ter tirado de letra. Mas eu não! Nunca estudei Libras, nem convivi com pessoas com deficiência de fala ou de audição. Já vi pessoas no ônibus se comunicando através de sinais, acredito que todos nós vimos em algum momento de nossas vidas tais pessoas. No entanto, como deve ser a convivência de pessoas “normais” com essas pessoas? Minha sorte é que deixei a redação pro final. A minha prova era a de cor rosa e eu levei bastante tempo lendo cada questão. Todas as questões tinham algum texto, quando não imagens atreladas ao texto, te forçando a ler bastante. Não que eu esteja reclamando, já que ler é uma coisa que não me incomoda. No entanto, confesso, terminei a prova sentindo cansaço nos olhos. Saí da faculdade, liguei o celular e fui recepcionada com uma mensagem instantânea da sogra, “como foi a prova?” Minha resposta que “foi divertido, mas cansativo” a deixou surpresa. “É a primeira vez que ouço alguém se referir ao Enem como divertido”. Que bom que tem uma primeira vez pra tudo!

Não sei como vai ser minha nota, nem como vai ser a nota das pessoas ao meu redor. Verdade seja dita, não li uma linha sequer que pudesse ser considerada estudo pra essa prova, mas queria fazer a prova exatamente assim, crua. Quero saber quanto eu estou apanhando pra vida, quanto meus estudos foram defasados e quanto meu cérebro consegue me surpreender nessa prova. Como costumo dizer pro meu amor, quando você não cria expectativas, qualquer resultado te satisfaz, e é bem nessa vibe que estou encarando o Enem. Conforme for, quem sabe, eu não volte a abordar este assunto no futuro? Só a minha nota poderá dizer!

sábado, 4 de novembro de 2017

Finados

Essa semana tivemos o feriado de finados, onde pensamos nas pessoas que morreram e que nos eram importantes. Dessas pessoas conto duas na minha vida, minha vó e minha mãe, pois as outras pessoas que morreram, apesar de serem da família, não são pessoas que eu possa dizer que tiveram um impacto muito grande na minha vida. É triste, mas é verdade, nem todos os mortos nos fazem falta.
Hoje passou na minha casa dois daqueles senhores que são testemunhas de Jeová. É engraçado falar com eles pois eles sempre começam nos fazendo uma pergunta quaisquer, que se você for ver friamente, não é, de fato, religiosa. A pergunta de hoje era “existe vida após a morte?” E eles ficam esperançosos que você responda a pergunta. Como não sei se testemunhas de Jeová acreditam em reencarnação, em ressurreição ou essas  coisas, preferi simplesmente dizer que é uma pergunta que varia de religião para religião. Então fui questionada se tenho uma bíblia em casa (e responder que sim faz com que tudo fique muito mais rápido, acreditem), então eles me apontam para um trecho da bíblia que, supostamente, responde minha dúvida. Que nem era minha, pra começo de conversa. Mas achei interessante eles aparecerem falando exatamente sobre esse tema. Provavelmente foi proposital, talvez não.
Essa semana também recebi a notícia de que o Giorgio está namorando e fiquei feliz por ele. Realmente foi um ciclo que se fechou, e eu agradeço por isso. De certa forma, quando você rompe certos relacionamentos, por mais doloroso que possa parecer no início, isso te faz bem. Isso te liberta. Isso é o que sinto em relação a várias pessoas, até mesmo pessoas que me fizeram, também, muito bem. As vezes eu sinto falta dessas pessoas pela importância que elas tiveram na minha vida, por exemplo minhas colegas de trabalho cujos contratos venceram no ano passado e, desde então, conto nos dedos de uma mão quantas vezes pude revê-las. Também penso nisso quando percebo, por exemplo, que ao enviar uma mensagem pra uma pessoa, a mensagem não vai e, quando percebo, a imagem dessa pessoa no Whatsapp está cinza, o que provavelmente significa que fui bloqueada. Mas diferente de outras vezes, eu não me importo, pois finalmente passou o período de luto, de dor e de sentir tristeza pelo que aconteceu ou deixou de acontecer. De certa forma, e isso me preocupa, me sinto um tanto quanto rancorosa, mas ao mesmo tempo, aliviada. Penso que dessa vez devo serrar todo e qualquer resquício da existência de certas pessoas na minha vida. Não que eu vá esquecer, pois um elefante nunca esquece, mas já passou da hora de pôr uma pedra em cima disso. E seguir caminho, de forma que a pedra evite que o que quer que seja que saiu dali saia de novo. Quantos ques!

Dia de finados me faz pensar que ainda não dispomos das cinzas da minha mãe. Me pergunto também, no caso dela ainda estar viva, como estaria. Penso também no legado que ela me deixou e me pergunto se devo continuar a observar de longe ou se devo começar a mexer nas coisas. Não adianta pensar no que eu posso fazer se não consigo me decidir a, de fato, tomar atitudes. Mas a vida segue, então vamos seguindo. Lembrando dos mortos e dos vivos, cuidando de nossas vidas mais do que das dos outros e torcendo pra que tenhamos vidas nem longas nem curtas, mas do tamanho que tem que ser. Não sou espírita, mas gosto de pensar que nos é dado exatamente o que precisamos pra evoluir, basta querermos.