sábado, 21 de abril de 2018

Culpa

Quando eu era pequena minha mãe me usou várias vezes como desculpa para não fazer alguma coisa que ela não queria fazer. Festa de casamento do meu primo, mas ela estava chateada com algo que minha prima disse, na maior inocência, e que a ofendeu? “A Luciana está com cólica, então vamos pra casa”. Ela tinha seus motivos, mas ela não era honesta com os outros em relação a eles. Inconscientemente, isso se tornou algo comum e rotineiro, ao ponto que eu disse uma vez que, se ela quisesse me usar de desculpa, que o fizesse.
Por falar em desculpa, vamos estudar um pouco essa palavra. Desculpar alguém é tirar dela a culpa. Então, quando alguém como eu pede desculpas por qualquer coisa, você ouvinte pode achar que é inútil, pois é uma desculpa automática. Eu falo sem pensar, então não é de coração. Oras, mas e se eu dissesse que eu realmente estou significando aquilo que digo? Então você provavelmente vai achar que eu tenho um complexo de culpa. E não estaria muito longe do que realmente é.
Quando cheguei em casa no dia em que tive que internar e não ouvi ela falando, soube que não podia deixar passar mais um dia. Quando a vi no hospital toda entubada e precisando de remédios pra fazer o coração bater, eu ainda acreditava que ela ficaria melhor em algum momento. Quando ela morreu e eu tive que ser forte pelo meu pai, eu fui. Então, quando a tempestade dos acontecimentos passou, veio a culpa. Culpa de pensar que, talvez, se eu tivesse pedido pra internarem ela antes, ela tivesse sobrevivido. Culpa de saber que ela morreu no hospital, sendo que eu tinha certeza que ela preferia morrer em casa. Culpa por não saber se, depois de tudo que eu fiz durante a minha vida inteira, tinha sido suficiente. Ela era uma pessoa difícil, mas eu a amava. E ela estava morta. E eu me sentia culpada por isso também, mesmo que dentro de mim eu soubesse que tinha feito tudo que podia, mesmo que dentro de mim eu soubesse que ela tinha descansado. Era minha culpa.
Depois daquilo minha pessoa de apoio foi embora. E eu conheci a pessoa que hoje faz meus dias felizes. Era o que eu queria dizer, mas a culpa me faz sentir o contrário. Ele é meu namorado e eu sei que, se minha mãe estivesse viva, ele não o seria. Mas ela não está, então ele é. Ele é mais novo que eu e eu sei que isso vai fazer com que nossa vida seja cheia de dificuldades, mas eu aceitei estar com ele mesmo assim. Eu tenho plena consciência de todos os problemas e dificuldades que a gente vai enfrentar. Então, eu tento estar bem. Mas não consigo.
Eu não consigo perceber quando ele está feliz se não estamos juntos. Eu continuo até hoje achando que ele fica mais feliz quando joga com outras pessoas do que quando joga comigo. Eu me sinto culpada quando jogo algo sozinha, pois parece que é errado eu me divertir sem ele, ainda mais quando ele está se sentindo mal. Seria mais fácil se eu conseguisse fazer com que ele se sentisse melhor, mas não é o caso. Eu não vejo, eu não percebo, eu não sinto que qualquer coisa q eu faça melhore alguma coisa. Parece q não faz diferença na verdade. Então fico pisando em ovos, tentando pelo menos não cair nas armadilhas de sempre. A da culpa, a de não ser suficiente (que, honestamente, era pra ser o tema de hoje, mas tivemos mudanças de última hora, como podem ver). Eu gosto de pensar que sou uma pessoa boa, no entanto, quando me vejo tendo tantas discussões, passando por tantas situações frustrantes, não conseguindo algo simples como a felicidade das pessoas que eu amo… Tudo isso me afeta de uma forma muito forte. Se estou deprimida? Não, acho que não. Mas esse complexo de culpa me persegue. A culpa de eu não estar no grupo dos prediletos lá no trabalho é por eu não ter estômago pra suportar as pessoas que não me fazem bem. A culpa da minha mãe estar morta é minha. A culpa do meu namorado não estar feliz nem satisfeito com nada que eu faça é pelo simples motivo que vem de mim. A culpa do meu irmão estar pensando que meu pai o odeia é minha. A culpa de termos tantos cães em casa é minha. A culpa de não conseguirmos vender a casa da minha vó é minha. Se o mundo acabar, não duvido nada, a culpa também será minha. Estou abraçando todas elas. Parece que a culpa me consome. Parece que ela me alimenta. Parece que ela está presa em mim, em cada célula do meu corpo. Devia eu morrer?
Desculpa…
Eu só queria ter paz, mas acho que a culpa vai me consumir toda a alma, até que não sobre nada de mim. Acho que preciso voltar a ir na psicóloga...

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